quarta-feira, 26 de março de 2014

Namoro ou Liberdade? (That Awkward Moment)

Dir: Tom Gormican
Roteiro: Tom Gormican
Elenco: Zac Efron, Miles Teller, Michael B. Jordan, Imogen Poots, Mackenzie Davis, Jessica Lucas
Duração: 94 minutos
Classificação Indicativa: 14 anos
Distribuidora: Imagem Filmes
Ano: 2014

NOTA: 2.5/5

Veredicto: "Três bons atores são prejudicados por um roteiro ruim."


O título original de "Namoro ou Liberdade?", "That Awkward Moment" (Aquele Momento Esquisito, em tradução livre), se refere ao ponto em que uma relação deve ser claramente definida. Afinal, o sexo vai evoluir em direção a um namoro ou, no final das contas, nada passou de mero entretenimento? É daí que o diretor/roteirista Tom Gormican retirou o argumento de seu filme.

O longa acompanha três amigos de vinte-e-poucos anos que vivem em Nova York e que se encontram em diferentes tipos de relacionamentos amorosos. Jason, o "líder" do grupo, é um solteiro inveterado, avesso a qualquer tipo de relação mais séria com qualquer mulher. Para ele, o que interessa é a transa, e nada mais. Daniel, colega de trabalho de Jason e "palhaço" do grupo, acompanha o seu melhor amigo e também evita namorar a qualquer custo. Por outro lado, Mikey é casado e se mostra o mais maduro dos três. Por vezes, ele até repreende o comportamento de seus amigos.

Entretanto, numa virada do destino, Mikey fica desolado quando a sua esposa lhe conta que está tendo um caso com o advogado e lhe pede o divórcio. Para tentar deixar o colega mais alegre, Jason e Daniel propõem a Mikey a seguinte aposta: dali em diante, nenhum dos três vai se envolver seriamente com nenhuma mulher.

Porém, como já era de se esperar, esse acordo não vai durar muito tempo. Jason acaba se interessando, não só fisicamente, por Ellie; Daniel se apaixona por sua velha amiga Chelsea; e Mikey volta a ter relações sexuais com sua mulher, Vera.

Já vou deixar claro que não tenho nenhum tipo de preconceito com comédia romântica. Pelo contrário, quando bem-feito, é um dos meus gêneros favoritos. Por isso mesmo, não pude deixar de ficar desapontado com "Namorou ou Liberdade?".

Tudo bem que a premissa do filme, em si, já é bastante idiota, mas em comédia romântica isso não é nenhum problema. Afinal, não faltam ótimos exemplos de filmes do gênero que fazem o melhor uso possível de um ponto-de-partida inverossímil. Porém, o grande problema do longa de Tom Gormican é que o roteiro não consegue desenvolver bem a  sua própria premissa.

Parte disso recai sobre os três personagens principais. Dentre eles, o único que é realmente identificável é Mikey, o jovem médico que não consegue aceitar que seu casamento chegou ao fim. São os trechos pertencentes ao seu enredo os mais interessantes e de maior insight. Por outro lado, Jason é, em poucas palavras, um verdadeiro idiota. Ele é um machista de marca maior, que vê as mulheres como nada mais do que um pedaço de carne. Ele é daquele tipo de sujeito que acha que o sexo feminino se resume à fascinação por sapatos e por homens bonitões, como ele. Enfim, é um personagem de espírito tão pobre que a sua redenção ao final do filme não convence. Já Daniel é mais decente do que Jason, porém é construído como um alívio cômico que, por acaso, ganhou uma história romântica para protagonizar. Em nenhum momento, ele parece estar falando sério. Está sempre rindo, fazendo piadinha... Em suma, também não cria maior empatia com o espectador.

Outros problemas do roteiro de Gormican são a falta de graça e o uso da fórmula sem a menor criatividade. Apostando alto em escatologia e palavrões, algo que já funcionou para diretores como Judd Apatow, por exemplo, os diálogos de Gormican quase nunca fazem rir e, infelizmente, soam forçados, como se ele se sentisse obrigado a enfiar o maior número  possível de citações a sexo, pênis ou vagina em cada cena, mesmo que isso não contribua em nada para a narrativa ou para a construção dos personagens.

Sobre a fórmula, ela é parte integrante das comédias românticas. Todo mundo já sabe o que vai acontecer: os amantes vão se conhecer, se apaixonar, se desentender, fazer as pazes e terminar juntos. Porém, a exemplo de filmes recentes como "O Lado Bom da Vida" e "À Procura do Amor", é possível criar algo diferente a partir do banal; e é isso que falta a "Namoro ou Liberade?". A fórmula é utilizada de maneira automática e desinteressante. Nem a grande declaração de amor de Jason a Ellie empolga!

Felizmente, o filme não é um desastre por causa do elenco mais do que competente. As mulheres do longa - Imogen Poots, Mackenzie Davis e Jessica Lucas - fazem um bom trabalho com o material que lhes é dado. Porém, quem carrega mesmo o filme são os três protagonistas: Zac Efron, Miles Teller e Michael B. Jordan, especialmente os dois últimos.

A possibilidade de assistir a esses três jovens atores contracenando foi o que me atraiu ao projeto. Efron ainda não recebeu um grande papel, mas é daqueles intérpretes que você aposta que quando tiver um excelente roteiro em mãos, vai fazer um belo trabalho. Já Teller e Jordan mostraram recentemente terem talento de sobra nos filmes "The Spectacular Now" e "Fruitvale Station - A Última Parada", respectivamente.

Em resumo, é uma pena ver três ótimos atores desperdiçados em um filme esquecível e que serve, no máximo, de diversão num ocioso sábado à tarde.


segunda-feira, 24 de março de 2014

Ninfomaníaca: Volume I (Nymphomaniac: Volume I)

Dir: Lars Von Trier
Roteiro: Lars Von Trier
Elenco: Charlotte Gainsbourg, Stellan Skarsgard, Stacy Martin, Shia LaBeouf, Uma Thurman, Christian Slater
Duração: 118 minutos
Classificação Indicativa: 18 anos
Distribuidora: California Filmes
Ano: 2013

NOTA: 3/5

Veredicto: "Lars Von Trier continua irônico, porém a primeira parte de 'Ninfomaníaca' deixa a desejar."


Lars Von Trier é uma pessoa que adora criar polêmica, seja com seus filmes, seja com suas atitudes. Em 2000, ao lançamento de "Dançando no Escuro", Björk, protagonista do longa, por mais de uma vez, falou mal de Von Trier e de como era difícil trabalhar com ele. Nove anos depois, seu filme "Anticristo" ganhou notoriedade graças às suas cenas de sexo explícitas e violência pesada, muitas delas direcionadas à personagem da atriz Charlotte Gainsbourg. Não foi por nada que o filme recebeu um "anti-prêmio" no Festival de Cannes por seu conteúdo considerado, por muitos, misógino. Em 2011, também no festival francês, Von Trier disse compreender Adolf Hitler, o que enfureceu muita gente e o fez ser considerado "persona non grata" do festival.

Pouco tempo depois dessa última controvérsia, o diretor anunciou que filmaria a história de vida de uma mulher viciada em sexo sem o menor pudor. Daí nasceu "Ninfomaníaca" (ou "Ninf()maníaca", se você quiser ser mais provocador), um longa dividido em duas partes e com um teor altíssimo de conteúdo sexual.

Para vender o filme, criou-se uma campanha de marketing nunca antes vista para um longa de arte. Trailers, prévias, diversos cartazes, fotos... Enfim, não era difícil saber que o filme estava para estrear. E para colocar a cereja em cima do bolo, ele ainda estreou na Dinamarca (país natal do diretor) bem no Dia de Natal. Infelizmente, a equipe de divulgação do projeto fez um trabalho melhor do que Lars Von Trier.

O filme começa com a figura de Joe - a ninfomaníaca do título - estatelada em um beco escuro e sinistro. É aí que aparece Seligman, um pescador que, ao ir fazer compras, se depara com ela e lhe oferece abrigo. Já na casa de Seligman, bem acomodada e tomando uma xícara de chá, Joe começa a contar como ela foi parar toda machucada naquele beco.

Para isso, ela volta até à sua infância, quando, segundo ela, descobriu a sua vagina enquanto brincava no banheiro com uma amiga. Daí, Joe passa a narrar os momentos mais importantes de sua vida sexual, indo desde quando ela perdeu a virgindade com seu vizinho, Jerôme, até o momento em que começa a ter vários parceiros sexuais ao mesmo tempo.

Se há uma coisa em que Lars Von Trier é bom, é em ser irônico; e "Ninfomaníaca: Volume I" é uma obra verdadeiramente sarcástica, a ponto de não sabermos se o longa é um drama ou uma comédia. Há sequências bastante melancólicas, e que fazem questão de serem nada sutis. Um exemplo claro disso é o quarto capítulo da história de Joe, "Delírio", em que a protagonista narra os últimos dias de vida de seu pai. Esse trecho é tão sério e dramático, que Von trier optou por apresenta-lo em preto-e-branco. Por outro lado, há outros momentos verdadeiramente engraçados (de um modo tragicômico, naturalmente), como quando a esposa de um dos parceiros de Joe vai até o seu apartamento, junto dos filhos, para "lavar a roupa suja".

Além disso, o diretor apresenta intervenções visuais em meio ao filme que lhe trazem um necessário dinamismo. Números na tela contam quantas vezes Jerôme penetra Joe em sua primeira transa, cálculos ensinam ao público a Sequência de Fibonacci, imagens de vídeos de pescaria fazem a comparação entre o método com que Joe encontra seus parceiros sexuais a rituais de pescador, e por aí vai... Visualmente, portanto, "Ninfomaníaca: Volume I" é bastante interessante.

O roteiro de Von Trier também é um dos pontos altos do longa. Apesar de, algumas vezes, as comparações feitas entre sexo e música, matemática, pescaria etc. serem um pouco forçadas, elas trazem uma perspectiva interessante a um tema que já foi tratado inúmeras vezes no cinema. Além disso, algumas sequências, como aquela em que Joe e sua amiga tentam transar com o maior número de homens possível em uma viagem de trem ou o terceiro capítulo da história, "Sra. H", são inspiradíssimas.

Porém, não há como negar que o filme se estica além do que devia. Apesar de usar diversos artifícios, visuais e narrativos, para manter o longa dinâmico, Lars Von Trier não consegue sumir com a impressão de que o filme poderia ser mais curto. Ao assistir ao filme, não pude deixar de pensar em como ele seria se não fosse apenas meio-filme, mas sim o filme completo de quatro (QUATRO!) horas de duração. Pode parecer desculpa dos distribuidores para arrecadar mais dinheiro nas bilheterias, mas é inegável que a ideia de dividir "Ninfomaníaca" em duas partes foi uma boa saída para evitar uma possível letargia. Se a primeira parte, com pouco menos de duas horas de exibição, já é cansativa, imagina um filme com quatro horas de uma tacada só.

Felizmente, o elenco, em alguns momentos, consegue agitar o longa. A dupla formada por Charlotte Gainsbourg (Joe) e Stellan Skarsgard (Seligman) é de uma ótima química, essencial para o bom funcionamento da história. Stacy Martin, como a jovem Joe, impressiona com um verdadeiro tour-de-force dramático, equilibrando drama, comédia e romance, e ainda, entremeando-os com diversas cenas de sexo. Shia LaBeouf surpreende como Jerôme, mostrando bastante competência tanto como ator dramático como ator cômico, e formando um belo entrosamento com Martin. A cena em que ele apresenta a Joe o seu escritório e seu colegas de trabalho é uma das melhores do longa. Mas quem se apresenta espetacularmente bem é Uma Thurman, como Sra. H, a esposa/mãe traída. Ela aparece em uma cena... mas que cena! É, de longe, o melhor momento do longa!

Distante de ser uma versão da Playboy TV adaptada ao público do cinema de arte, "Ninfomaníaca: Volume I" apresenta ótimas ideias e, em muitos momentos, é bem interessante. Porém, não há como esconder o fato de que se fosse mais curto, poderia ter sido bem melhor.



terça-feira, 18 de março de 2014

Caçadores de Obras-Primas (The Monuments Men)

Dir: George Clooney
Roteiro: George Clooney e Grant Heslov (baseado no livro 'The Monuments Men' escrito por Robert M. Edsel e Bret Witter)
Com: George Clooney, Matt Damon, Bill Murray, John Goodman, Jean Dujardin, Bob Balaban, Hugh Bonneville, Cate Blanchett
Duração: 118 minutos
Distribuidora: Fox Film
Classificação Indicativa: 12 anos
Ano: 2014

NOTA: 2.5/5

Veredicto: "O grande problema do filme é confundir nostálgico com datado."


George Clooney é um dos atores que conseguiu fazer melhor a transição da frente das câmeras para detrás delas, seja como produtor, diretor ou roteirista. Como intérprete, Clooney conseguiu ser indicado quatro vezes ao Oscar, ganhando um prêmio, por "Syriana - A Indústria do Petróleo", em 2006. No papel de diretor/produtor/autor, ele também soma quatro indicações, seja por filmes próprios ("Boa Noite, e Boa Sorte", "Tudo pelo Poder") ou de terceiros ("Argo", pelo qual ganhou o Oscar em 2013 como produtor). Digo tudo isso para deixar claro o quanto a figura de George Clooney é importante dentro da indústria hollywoodiana.

Por isso mesmo, quando o ator anunciou que iria dirigir um novo filme, ambientado na 2ª Guerra Mundial, encabeçado por um elenco de dar inveja a qualquer diretor e contando com o maior orçamento de sua carreira como realizador, não houve um jornalista de cinema que não tenha pensado: "A Academia vai adorar esse filme!"

Quando o primeiro trailer saiu, as expectativas esfriaram um pouco, pois muitos perceberam que o longa talvez fosse mais comercial do que um forte concorrente a prêmios. Alguns meses depois, o filme foi retirado de sua data de estreia original, dezembro de 2013 - bem no meio da temporada de ouro -, e transferido para um mês mais tranquilo (e conhecido por abrigar filmes mais fracos): fevereiro.

Quando as primeiras críticas começaram a sair, as suposições se confirmaram: "Caçadores de Obras-Primas" simplesmente não era grande coisa. E eu concordo plenamente com isso.

Ambientado na primeira metade dos anos 1940, na reta final da 2ª Guerra Mundial, "Caçadores de Obras-Primas" acompanha o grupo de mesmo nome, idealizado pelos americanos, para encontrar obras de arte que haviam sido roubadas pelos nazistas, que pretendiam colocá-las em exposição no que se chamaria "Museu do Führer". O edifício, fruto de uma antiga apreciação de Adolf Hitler pelas belas-artes, constituiria o maior acervo museológico do mundo e seria construído na cidade austríaca de Linz.

O longa começa com o criador do projeto, Frank Stokes, tentando convencer o então presidente norte-americano, Franklin Roosevelt, a investir na ambiciosa empreitada. Segundo Stokes, o grupo, aparentemente desnecessário em meio a um conflito no qual milhões de pessoas morreram, iria, em suas palavras, "impedir que a Mona Lisa deixasse de sorrir", ou seja, não só frustaria os desejos de Hitler como também manteria viva a cultura das nações cujas obras foram roubadas. No final das contas, Roosevelt aprova o projeto e Stokes põe as mãos na massa.

Ele convoca, então, velhos conhecidos seus, restauradores, arquitetos e especialistas no estudo da arte. O grupo passa por um treinamento militar básico, embarca para a Europa e dali inicia a sua missão.

É exatamente nesse ponto em que o filme começa a desandar. Ao invés de criar um objetivo único para as suas personagens, mantendo o grupo unido durante toda a projeção, Clooney, junto de seu co-roteirista e parceiro de longa data, Grant Heslov decidem em criar pequenas sub-tramas dentro do filme, dispersando o foco e separando os personagens pela maior parte de seus 118 minutos de duração.

Ao meu ver, a melhor opção seria iniciar o filme com os Caçadores já trabalhando na Europa e indo atrás de uma última obra de arte que falta ou de um esconderijo nazista essencial para conclusão de sua missão. Dessa forma, o espectador ficaria mais ligado à trama, como também teriam muito mais cenas com todos os integrantes do grupo juntos. Afinal, venhamos e convenhamos, o grande chamariz de "Caçadores de Obras-Primas" é a possibilidade de ter George Clooney, Matt Damon, Bill Murray, John Goodman etc. contracenando uns com os outros. Infelizmente, o que falta ao filme é exatamente mais cenas do clã todo reunido e um objetivo mais poderoso.

Do jeito que o filme está, o foco do espectador fica disperso em várias narrativas confusas e, na maior parte do tempo, desinteressantes. Além disso, alguns personagens ficam deslocados dentro do longa. Um ótimo exemplo disso são as personagens de Matt Damon e Cate Blanchett, que num enredo paralelo entre James Granger (Damon) e a historiadora Claire Simon (Blanchett), ambientado numa Paris ocupada pelos alemães, nunca parece estar em perfeita sintonia com o restante do filme.

Outro problema sério que tive com "Caçadores de Obras-Primas" foi o tão retrógrado que ele é. Apesar de ter sido filmado em 2013, parece ter sido escrito há mais de cinquenta anos atrás, uma vez que se assemelha, e muito, com aqueles antigos filme-propaganda produzidos pelos EUA durante e um pouco depois da 2ª Guerra. Os alemães são um bando de vilões de gibi, estereotipados ao extremo. Não há um convincente! Além disso, ninguém merece a cena em que a personagem de Clooney dá lição de moral num militar nazista. Desculpa, mas até parece que os americanos já não cometeram muitos erros e desvios de conduta em outros conflitos armados. 

Isso sem contar com a presença enigmática dos soviéticos no longa. Além de serem, mais uma vez, meras caricaturas ambulantes, os russos aparecem na história não sei para o quê. A função deles na trama poderia ter sido mantida apenas em narrações ou em comentários dos protagonistas; não era em nada necessário a estúpida competição entre EUA e URSS no clímax do longa, com os americanos vencendo a disputa e ainda deixando uma bandeira sua - gigantesca, diga-se de passagem - só para denegrir a imagem dos soviéticos. Não sou de esquerda nem nada, mas até eu achei infantil essa "brincadeirinha", remanescente dos tempos da Guerra Fria.

Felizmente, o filme se redime em alguns aspectos. O elenco está competente, mesmo que alguns de seus membros sejam muito sub-utilizados, como a excelente atriz e recém-oscarizada Cate Blanchett. Ela merecia um papel muito melhor do que o que lhe foi dado! Além disso, a parte técnica do longa é primorosa, contando com trabalhos de direção de arte e figurino exemplares. Isso sem contar com a bonita fotografia de Phedon Papamichael e a trilha sonora vibrante de Alexandre Desplat, ambas contribuindo com um ar nostálgico ao filme.

As aventuras dos Caçadores de Obras-Primas são mais do que merecedoras de um filme, especialmente por servirem como um ponto de vista diferente de um dos períodos mais trágicos da História recente. Porém, o longa que foi produzido a partir de seu legado, peca ao priorizar posicionamentos políticos ultrapassados, ao invés de apenas fazer a esses homens a sua devida homenagem.


Refém da Paixão (Labor Day)

Dir: Jason Reitman
Roteiro: Jason Reitman (baseado no livro 'Labor Day' escrito por Joyce Maynard)
Elenco: Kate Winslet, Josh Brolin, Gattlin Griffith, Clark Gregg, J. K. Simmons, James Van Der Beek, Tobey Maguire
Duração: 111 minutos
Classificação Indicativa: 12 anos
Distribuidora: Paramount Pictures
Ano: 2013

NOTA: 2.5/5

Veredicto: "Jason Reitman parece ter feito o filme com bastante esmero, porém isso não compensa a falta de verossimilhança da história."


Todo mundo já ouviu aquela clássica lenda do Príncipe Encantado, cuja única missão é salvar a donzela em perigo no final da história. O da Cinderela recuperou o seu sapatinho de cristal, o da Branca de Neve a trouxe de volta dos mortos, o da Bela Adormecida a tirou de um sono profundo, e por aí vai. Entretanto, você deve estar se perguntando por que eu estou falando de contos de fadas; e a razão é muito simples. É que "Refém da Paixão", no fundo, não passa de mais uma história sobre uma moça em apuros que precisa de um príncipe para resgatá-la.

Passado em 1987, o longa acompanha uma mulher divorciada, Adele, e seu filho adolescente Henry. Desde que se separou do pai de seu rebento, Adele mudou completamente de comportamento e aparência. Antes, era uma mulher jovem, linda e divertida, que adorava dançar. Porém, o divórcio lhe foi cruel e a transformou em uma moça que parece estar sempre cansada, exausta, cujas mãos tremem e que raramente sai de casa. É óbvio que isso afeta Henry profundamente, que, a fim de confortar a mãe, também abriu mão de uma vida social em troca de dias e mais dias enfiado dentro de casa, lendo revistas em quadrinhos, jogando video-game ou assistindo a filmes de ficção-científica.

Porém, no feriado do Dia do Trabalho (daí o título original do filme), quando Adele e Henry vão ao supermercado fazer compras para a casa, o menino se depara com um homem ferido, que precisa de cuidados médicos imediatamente. Henry oferece, então, ao sujeito, Frank, uma carona, mesmo sabendo que sua mãe não vai concordar com a ideia. Porém, no final das contas, Adele e Henry não têm outra escolha a não ser ajudar o homem desconhecido, uma vez que ele é um fugitivo da polícia, acusado de assassinato.

De início, a relação entre mãe e filho e o bandido misterioso não é das melhores, mas, com o passar do final de semana, Frank se mostra nada ameaçador. Pelo contrário, ele é uma pessoa de ouro, com diversas habilidades e um bom coração, e cujo crime não passa de um mal-entendido que já dura muitos anos.

Com isso, Adele começa a ver em Frank uma nova possibilidade de reacender a chama da paixão em seu coração, há bastante tempo apagada. Mesmo que para isso tenha que mudar sua vida completamente mais uma vez e, em consequência, a de seu filho também.

O grande problema de "Refém da Paixão" não é a surpreendente decisão de Jason Reitman em mudar, mesmo que por pouco tempo, o seu estilo como realizador. Conhecido por suas comédias satíricas e irônicas, como "Obrigado por Fumar" e "Jovens Adultos" (seu ótimo filme anterior), aqui ele decidiu investir em um romance com toques de suspense; e até que em certos aspectos ele se dá muito bem. Nos momentos de maior tensão, como o primeiro ato da história e o seu clímax, Reitman consegue deixar o espectador na ponta da cadeira. Enquanto isso, nas cenas de romance, ele cria uma atmosfera bastante sensível, quase onírica até.

A questão é que, apesar de ele conseguir construir momentos de suspense e de paixão com bastante competência, o roteiro, adaptado por ele mesmo do livro de Joyce Maynard, não consegue ser tão bem-sucedido. O grande erro é que, em momento algum, dá para acreditar no romance entre as personagens de Kate Winslet e Josh Brolin. Frank é perfeito demais para ser verdade! Ele sabe consertar de tudo um pouco - carros, aquecedores, dobradiças, é só dizer -, é um exímio cozinheiro, sabe jogar beisebol e, até o final do filme, ele consegue aprender a dançar rumba. Enfim, apesar de toda a questão do assassinato envolvendo o seu nome, no resto, a personagem só falta ter poderes mágicos.

Outro ponto que incomoda é o fato de Adele, uma mulher basicamente avessa à vida em sociedade, em questão de dias se apaixonar loucamente por um sujeito que ela nem conhece direito e que, ainda, é um foragido da polícia. Tudo bem, que o homicídio em si não passe de um mal-entendido, mas quem garante? Quem assina embaixo da versão dada pelo suposto criminoso? Em poucas palavras, achei a personagem de Winslet incoerente. Se ela se tornasse amiga de Frank, ainda vai lá, mas amante, a ponto de querer fugir com ele, levando filho e tudo para fora do país? Achei forçado!

Para completar, surpreende ainda ninguém da vizinhança ter notado a presença de Frank dentro da casa de Adele. O bandido vivia mais do lado de fora do que de dentro, seja consertando o carro ou ensinando Henry a jogar beisebol. Enfim, para quem buscava se esconder das autoridades, até que Frank andava bem saidinho.

O elenco, porém, ao contrário do enredo, está bem. Brolin e Winslet não tem papeis nem performances memoráveis, mas nem por isso deixam de estar competentes e seguros em suas personagens. Além disso, em papeis secundários, há típicos "atores de personagem", como J. K. Simmons e James Van Der Beek (ambos em basicamente uma cena) e Clark Gregg, muito bem como de costume, encarnando o ex-marido de Adele e pai de Henry.  Tobey Maguire, por sua vez, apenas narra o filme, como Henry já adulto (aparece em carne e osso em um par de cenas no final do longa, mas nas quais entra mudo e sai calado). 

Todavia, no frigir dos ovos, que merece mais elogios é o jovem Gattlin Griffth. Apesar do centro de toda a história ser o romance entre Adele e Frank, quem é o verdadeiro protagonista do filme é Henry. São as suas palavras que narram os acontecimentos, as suas atitudes que mudam os rumos do enredo e os seus dramas que realmente envolvem  o espectador e levam o filme adiante. Felizmente, Griffith se mostra bastante capaz de carregar o filme em suas costas e elevar o material consideravelmente. Porém, não deixa de ser uma pena ver essa ótima performance dentro de um filme com uma história tão absurda.

Pela perspectiva técnica, o filme é muito bem-feito. A reconstituição de época por parte da direção de arte (Steve Saklad e Mark Robert Taylor) e do figurino (Danny Glicker) é precisa e ajuda bastante em localizar a história no tempo. A fotografia de Eric Steelberg é um verdadeiro primor, tanto nas cenas do "presente" quanto nos flashbacks, e a trilha sonora de Rolfe Kent - velho colaborador de Reitman - constrói com bastante eficiência o clima do longa.

Em resumo, "Refém da Paixão" é um filme sobre amor feito com muito amor por Jason Reitman e cia. Entretanto, mesmo com bastante boa vontade, é difícil de engolir o romance que serve de espinha dorsal para a narrativa.