Roteiro: Walter Campbell e Jonathan Glazer (baseado no livro 'Under the Skin' escrito por Michel Faber)
Elenco: Scarlett Johansson, Jeremy McWilliams, Lynsey Taylor Mackay
Duração: 108 minutos
Classificação Indicativa: 16 anos
Distribuidora: Paris Filmes
Ano: 2013
NOTA: 3.5/5
Veredicto: "Um filme difícil e surreal, mas que merece ser visto."
Em seu último filme, há nove anos atrás, o diretor Jonathan Glazer já demonstrava a sua afinidade pelo cinema de nicho. "Reencarnação" é teoricamente um suspense, mas ao mesmo tempo, sustos e arrepios não são encontrados no longa. Pelo contrário, influenciado fortemente pela estética do diretor Stanley Kubrick, Glazer construiu um filme lento, recheado de belas imagens e de uma sofisticação ímpar. Nem sempre é bem sucedido em seus objetivos, porém é inegável que seja um filme bastante curioso e interessante.
Digo isso para chegar à seguinte constatação: se em "Reencarnação", Glazer flertava com a mistura de cinema de gênero e cinema de arte, em seu mais novo longa, "Sob a Pele", ele mergulha fundo nessa proposta e entrega uma ficção-científica longe daqueles exemplos hollywoodianos aos quais estamos acostumados.
Protagonizado por ninguém menos que Scarlett Johansson, o filme acompanha uma alienígena que chega à Terra com a missão de caçar homens na rua e levá-los para uma casa deteriorada no meio do nada. Esperando por sexo com uma bela mulher, os sujeitos são surpreendidos por uma espécie de gosma negra que os engole e os transforma em alimento para os extraterrestres. Paralelo a isso, um motociclista segue todos os passos da alienígena sedutora, como se fosse uma espécie de supervisor.
Pronto, é essa a sinopse do filme. Ao lê-la, parece ser uma história bem simples - e realmente é - porém se fosse depender do filme, você dificilmente a entenderia. Em nenhum momento, o longa faz questão de deixar claro que a personagem de Scarlett é uma alienígena. A não ser uma curiosa cena final e alguns momentos no início do filme, a alien poderia ser uma mulher como outra qualquer. A função do motociclista também nunca fica muito clara. A partir de suas atitudes, supõe-se que ele seja um vigia, mas como ele nunca fala durante a projeção e a extraterrestre nunca se comunica com ele, tudo fica no subjetivo mesmo.
Entretanto, tirando esses detalhes, a narrativa até que não é tão hermética quanto se espera. O enredo tem começo, meio e fim, e pela maior parte do tempo é compreensível. Portanto, quando comparado a filmes como "O Cão Andaluz" ou "Holy Motors", surreais ao extremo, "Sob a Pele" pode ser considerado uma narrativa clássica.
Porém, no final das contas, o filme de Glazer funciona muito mais como uma experiência sensorial. Auxiliado pela criativa fotografia digital de Daniel Landin, o diretor consegue imprimir um visual diferenciado ao seu filme. Opondo-se aos enquadramentos e palheta de cores tradicionais usados por Harris Savides em "Reencarnação", Landin abusa da modernidade em "Sob a Pele". Por um lado, as cenas de Scarlett Johansson nas ruas, em lugares públicos ou dentro do furgão que sua personagem dirige enquanto procura homens para se alimentar são filmadas por câmeras escondidas em lugares estratégicos. Se você se lembrou dos programas de pegadinhas que fazem sucesso na televisão, você não ficou muito longe da proposta sugerida por Glazer. Todos os homens fisgados por Scarlett são transeuntes anônimos que não fazem a menor ideia de que estão fazendo parte de uma filmagem, o que dá origem a alguns dos melhores (e mais inusitados) momentos do filme. Por outro lado, as sequências em que as vítimas da extraterrestre são assassinadas primam pela complexidade. Ilusões de ótica, truques com espelhos, efeitos especiais e contraste entre o preto e cores primárias dão origem a imagens poderosas. A cena em que duas vítimas engolidas pela gosma negra interagem é um ponto alto do filme.
Outro que ajuda - e muito - Glazer a construir a sua visão é o compositor Mica Levi. O ponto narrativo principal de "Sob a Pele" é o descobrimento dos sentimentos humanos por parte da alienígena; e para a isso, a trilha sonora é de suma importância. Enquanto a extraterrestre mostra-se indiferente aos homens e simplesmente faz o seu serviço, a música é recheada de efeitos sonoros esquisitos e um ritmo quebrado e extravagante. Todavia, quando Scarlett começa a sentir compaixão por uma de suas vítimas, as composições mudam e adotam traços de sinfonias mais tradicionais, mas sem abandonar por completo a excentricidade da música alienígena. Afinal, mesmo que comece a cultivar características humanas, a protagonista ainda é, e sempre será, um alien.
Para quem espera um tour-de-force de Scarlett Johansson ou cenas e cenas de sangue e violência, sairá decepcionado. Devido às limitações emotivas da personagem, Johansson cumpre bem o seu papel, mas não tem uma interpretação muito complexa, cheia de nuances. Já os assassinatos são mais estranhos do que violentos. Na realidade, a cena mais violenta do longa é uma em que um bebê fica abandonado em uma praia depois que seus pais morrem afogados, mas mesmo assim, é uma violência psicológica, e não corporal.
Em resumo, se você pretende ver o filme só para desfrutar da nudez de Scarlett Johansson, é melhor ficar em casa e apreciar as fotos que circulam pela internet. Porém, para quem procura assistir a algo inusitado e diferente de tudo que está em exibição nos cinemas, "Sob a Pele" é uma boa pedida.