Dir.: Steven Soderbergh; Escrito por Richard LaGravenese; Com Michael Douglas, Matt Damon, Dan Aykroyd, Rob Lowe. 2013 - HBO Films (118 min. - 16 anos)
Como já se sabe, Steven Soderbergh decidiu ausentar-se do cinema por tempo indeterminado para poder se dedicar à sua carreira de pintor. Logo após esse anúncio veio a curiosidade de toda a comunidade cinéfila em saber quais seriam os últimos longas do diretor antes de sua aposentadoria. Seus dois trabalhos de 2012, o longa de ação "À Toda Prova" e a comédia dramática "Magic Mike" eram bons, mas não deixavam de ser decepcionantes. Para 2013, Soderbergh preparou dois filmes, sendo o primeiro deles o thriller "Terapia de Risco", uma história que começa boa, mas que termina de um jeito desastroso. Porém, como não é burro nem nada, Soderbergh deixou o melhor para o final, a deliciosa cinebiografia de Liberace "Behind the Candelabra".
Lançado como telefilme da HBO (nenhum estúdio quis bancar o projeto por ser "gay demais"!), "Candelabra" tem como personagem principal, na verdade, Scott Thorson, um treinador de animais que de uma hora para outra tem a sua vida completamente modificada. Tudo isso acontece quando, em um bar, Scott conhece Bob Black, um amigo do mais famoso pianista norte-americano, Liberace.
Um dia, então, Bob leva Scott a um show de Liberace e, em seguida, o leva ao camarim do artista, quando fica claro que o renomado músico quer mais do que apenas um aperto de mão do jovem. A partir daí, Scott vai ficando cada vez mais íntimo de Liberace até que os dois finalmente engatam um relacionamento, e é exatamente esse período - mais especificamente, seis anos - que o filme aborda.
Em primeiro lugar, deve-se louvar as performances dos dois protagonistas do longa. Como Liberace, Michael Douglas arrasa nos trejeitos, no jeito de falar, no caminhar... Enfim, ele literalmente incorpora o pianista e faz dessa uma das melhores atuações de sua carreira. Não é por nada que ele ganhou o Emmy de melhor ator por seu desempenho e posso apostar que caso o filme tivesse sido exibido nos cinemas, ele seria um candidato certo ao Oscar também. Em poucas palavras, é simplesmente o tipo de performance que não dá para esquecer tão facilmente. Daí entende-se porque Soderbergh fez questão de esperar Douglas terminar o tratamento de seu câncer para só então rodar o filme.
Porém, apesar de Douglas roubar a cena, Matt Damon também está excelente como Scott. É, sem dúvida, uma performance mais contida do que a de Douglas, mas mesmo assim não é menos competente. Seu personagem passa por diversos altos e baixos durante o filme, o que faz com que Damon tenha que saber lidar com as transições entre o drama e a comédia, e ele se sai extremamente bem nesse aspecto, não caindo em nenhum momento na caricatura ou no melodrama.
Entretanto, vale a pena ressaltar também a breve, mas hilária participação de Rob Lowe como o dr. Jack Startz, cirurgião plástico de Liberace. O personagem é extremamente difícil, uma vez que poderia ter facilmente caído na chanchada, afinal o sujeito tem o rosto lotado de botox e possui um bronzeado visivelmente falso, porém Lowe é o destaque sempre que aparece e, ainda, evita exagerar mais do que o papel exige.
Como estamos falando de um filme de Steven Soderbergh, não há como não falar de seu trabalho de fotografia sob o pseudônimo de Peter Andrews. Adotando uma palheta amarelada para as cenas internas, o diretor realça o luxo e a exuberância da vida levada pelo pianista, porém nas cenas dos shows, Soderbergh resolve dar ênfase ao brilho excessivo das peças do figurino de Liberace, adotando, portanto, um visual mais convencional, mas com uma iluminação mais forte. A única ressalva é ao uso da câmera na mão em alguns momentos do último ato. Apesar do recurso ser usado para intensificar a sensação de insegurança de Scott Thorson num trecho bem tenso da história, o tremelique da câmera não combina com a técnica adotada no resto do filme, ficando deslocado no contexto geral.
Elogios ainda devem ser feitos ao trabalho da figurinista Ellen Mirojnick, que já havia trabalhado antes em projetos bastante kitsch, como "Tropas Estelares" e "Showgirls", ambos do holandês Paul Verhoeven. Isso obviamente colaborou para o seu excelente trabalho em "Behind the Candelabra", no qual reproduziu com fidelidade diversos trajes de Liberace, como também criou novas peças de vestuário para os outros personagens do filme. Há também a produção de arte impecável do trio Howard Cummings, Patrick M. Sullivan Jr. e Barbara Munch, que trazem para a tela o mundo cafona de Liberace, e o importantíssimo trabalho de maquiagem, muito bem realizado.
O roteiro de Richard LaGravenese é impecável. Os diálogos são muito bem escritos e a história é contada de uma forma fluente, sem parecer apenas uma sucessão de fatos, mas sim uma conturbada e interessantíssima história de amor acompanhada de observações sobre a cultura da celebridade, a importância dada à idade pela sociedade contemporânea e a questão da homossexualidade, que nos anos 1980 - período no qual o filme é ambientado -, ainda era tabu, mas que vinha sendo empurrado com urgência para uma sociedade conservadora devido ao advento da AIDS.
Embalado por uma ótima trilha sonora de Marvin Hemlisch, em seu último trabalho antes de sua morte em agosto de 2012, "Behind the Candelabra" pode ser considerado desde já um dos filmes mais interessantes de 2013 e um canto do cisne respeitável para o diretor Steven Soderbergh.
NOTA: 4/5
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