sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Temporada de Prêmios: Globo de Ouro

Foram anunciados hoje de manhã os indicados ao Globo de Ouro, prêmio entregue pela Associação dos Correspondentes Estrangeiros em Hollywood, um pequeno grupo de cerca de 90 pessoas que inclui jornalistas de diversos países do mundo, inclusive do Brasil.

Conhecido por ser uma espécie de "termômetro do Oscar", o Globo de Ouro muitas vezes é motivo de chacota da indústria, já que é conhecido por adorar estrelas, e por isso, fazer todo ano algumas escolhas bastante duvidosas só para ter o maior número possível de celebridades em sua cerimônia. Esse ano, porém, os Globos se mostraram bastante coerentes e evitaram ao máximo as tais indicações curiosas. Mas nem por isso faltaram surpresas na lista de indicações.

Apesar da liderança de "12 Anos de Escravidão" e "Trapaça" não ter sido nem um pouco
inusitada (ambos os filmes receberam 7 indicações), algumas inclusões e omissões chamaram bastante a atenção. A principal, delas foi, sem dúvida alguma, a esnobada generalizada a "O Mordomo da Casa Branca". Um dos grandes nomes na lista do SAG (Sindicato de Atores), na qual o filme se fez presente em 3 categorias - incluindo melhor elenco -, o longa de Lee Daniels não recebeu nenhuma menção da HFPA. Nem mesmo para Oprah Winfrey, dada como certa para uma indicação na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante. Os correspondentes estrangeiros realmente não gostaram desse filme!

Além disso, a escassez de indicações para "Walt nos Bastidores de Mary Poppins" (que título, hein?) também foi surpreendente. O filme, assim como no SAG, recebeu apenas uma indicação, para Melhor Atriz - Drama para Emma Thompson. Essa situação é decepcionante para um filme até pouco tempo atrás considerado um forte concorrente na temporada de premiações, especialmente no Globo de Ouro, onde esperava-se indicações em Melhor Filme - Drama e Melhor Ator Coadjuvante para Tom Hanks. Enfim, eu não queria ser funcionário da Disney nesse momento.

Quanto a "O Lobo de Wall Street", novo filme de Martin Scorsese, a situação também foi decepcionante. Apesar de ter sido indicado a Melhor Filme - Comédia/Musical e a Melhor Ator - Comédia/Musical para Leonardo DiCaprio, não eram esperadas as omissões de Jonah Hill em Melhor Ator Coadjuvante e do próprio Scorsese em Melhor Diretor, ainda mais ele que é um queridinho do Globo de Ouro. Parece que a HFPA gosta, mas não ama o filme.

Em Melhor Canção Original, a falta de Lana Del Rey e sua canção para "O Grande Gatsby", "Young and Beautiful", foi bastante sentida. A música era a fórmula perfeita para uma indicação para os Globos: uma intérprete jovem em ascensão + uma balada romântica + sucesso nas rádios = indicação garantida! Ao invés de indicar Lana, o Globo demonstrou mais uma vez o seu afeto por outra jovem cantora, Taylor Swift, indicando-a pelo segundo ano seguido, desta vez pela música "Sweeter than Fiction" do filme "One Chance" (ano passado Taylor foi indicada com a banda The Civil Wars por "Safe and Sound" de "Jogos Vorazes"). Entretanto, se havia uma canção marcada a ferro para receber uma indicação era "Ordinary Love" do U2 para o filme "Mandela: Long Walk to Freedom".

Falando em Mandela, a sua morte certamente influenciou os votantes, já que a sua
cinebiografia, que havia recebido críticas mornas, foi surpreendentemente indicada a três prêmios: Melhor Canção Original, Melhor Trilha Sonora e Melhor Ator - Drama para Idris Elba.

"Rush: No Limite da Emoção" também surpreendeu muita gente, recebendo indicações para Melhor Ator Coadjuvante para Daniel Brühl (num papel de protagonista, diga-se de passagem) e Melhor Filme - Drama. O filme de Ron Howard andava esquecido depois que foi mal de bilheteria, porém tanto os Globos quanto o SAG lembraram dele e o botaram novamente na corrida pelo ouro.

Outras surpresas incluíram as indicações de Kate Winslet em Melhor Atriz - Drama por "Refém da Paixão" e Julie Delpy e Greta Gerwig em Melhor Atriz - Comédia/Musical por "Antes da Meia-Noite" e "Frances Ha", respectivamente, e a omissão do finado James Gandolfini na categoria de Melhor Ator Coadjuvante por "À Procura do Amor".

Sem mais delongas, vamos aos indicados...

MELHOR FILME - DRAMA

MELHOR FILME - MUSICAL/COMÉDIA
MELHOR ATRIZ - DRAMA
MELHOR ATOR - MUSICAL/COMÉDIA
  • Christian Bale - Trapaça
  • Bruce Dern - Nebraska
  • Leonardo DiCaprio - O Lobo de Wall Street
  • Oscar Isaac - Inside Llewyn Davis - Balada de um Homem Comum
  • Joaquin Phoenix - Ela
MELHOR ATRIZ - MUSICAL/COMÉDIA
MELHOR ATOR COADJUVANTE
  • Barkhad Abdi - Capitão Phillips
  • Daniel Brühl - Rush: No Limite da Emoção
  • Bradley Cooper - Trapaça
  • Michael Fassbender - 12 Anos de Escravidão
  • Jared Leto - Dallas Buyers Club
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
  • Sally Hawkins - Blue Jasmine
  • Jennifer Lawrence - Trapaça
  • Lupita Nyong`o - 12 Anos de Escravidão
  • Julia Roberts - Álbum de Família
  • June Squibb - Nebraska
MELHOR DIRETOR
  • Steve McQueen - 12 Anos de Escravidão
  • David O. Russell - Trapaça
  • Paul Greengrass - Capitão Phillips
  • Alfonso Cuarón - Gravidade
  • Alexander Payne - Nebraska
MELHOR ROTEIRO
  • 12 Anos de Escravidão (John Ridley)
  • Trapaça (Eric Warren Singer e David O. Russell)
  • Ela (Spike Jonze)
  • Nebraska (Bob Nelson)
  • Philomena (Jeff Pope e Steve Coogan)
MELHOR TRILHA SONORA
  • 12 Anos de Escravidão (Hans Zimmer)
  • All Is Lost (Alex Ebert)
  • A Menina que Roubava Livros (John Williams)
  • Gravidade (Steven Price)
  • Mandela: Long Walk to Freedom (Alex Heffes)
MELHOR CANÇÃO ORIGINAL
MELHOR FILME DE ANIMAÇÃO
MELHOR FILME DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

domingo, 8 de dezembro de 2013

Primeiro Dia de um Ano Qualquer


Dir.: Domingos Oliveira; Escrito por Domingos Oliveira; Com Maitê Proença, Domingos Oliveira, Priscilla Rozenbaum. 2012 - Forte Filmes (81 min. - 12 anos)


Com dificuldades para lançar os seus dois últimos projetos, o diretor e roteirista Domingos Oliveira encontrou como solução estrear ambos os filmes em um mesmo final de semana. O primeiro longa é "Paixão e Acaso" (que já foi objeto de um texto aqui no Cinematógrapho) e o segundo é o de título auto-explicativo "Primeiro Dia de um Ano Qualquer".

Ganhador do prêmio de melhor roteiro no Festival de Gramado 2012, o filme se desenrola ao longo de um dia 1º de janeiro (daí o título), quando um grupo de amigos e familiares está reunido em uma aconchegante casa de veraneio na Região Serrana fluminense depois de passarem o Revéillon juntos. Entretanto, o que era para ser algumas horas tranquilas, de puro ócio, se transforma rapidamente em um turbilhão de emoções (boas e ruins) envolvendo uma gama de personagens diferentes.

Diferentemente de "Paixão e Acaso", "Primeiro Dia de um Ano Qualquer" não chega a causar vergonha pela sua produção pobre. Na verdade, aqui o pior são os títulos, todos dignos de Windows Movie Maker. Pelo menos no outro filme de Domingos Oliveira os letreiros iniciais fazem uma simpática homenagem a Woody Allen, apresentando a característica fonte Windsor dos longas do diretor nova-iorquino.

Entretanto, em "Primeiro Dia...", a edição é infinitamente superior e a fotografia muito melhor realizada, diria até que em alguns momentos é bem bonita. Claro que filmar em uma belíssima casa (da atriz Maitê Proença) no meio da floresta com as formas da serra fluminense como pano de fundo facilitam (e muito!) o trabalho.

Infelizmente, o roteiro deixa a desejar. O filme é daqueles em que não há uma história muito bem definida, ao invés disso, o texto parece mais um amontoado de observações e pequenos esquetes. Há alguns traços de enredo, como a história envolvendo a personagem de Priscilla Rozenbaum, que passa o dia inteiro questionando o seu casamento, porém elas são desinteressantes, possuem figuras bem chatinhas e algumas delas têm uma moral, no mínimo, duvidosa. Em poucas palavras, falta foco ao filme. Não há nenhum objetivo, nenhum obstáculo no caminho dos personagens, tanto que, no final das contas, o longa termina do mesmo jeito que começou. É simplesmente monótono!

O elenco, por outro lado, parece perceber que o texto em si não é nenhuma maravilha e, portanto, tenta trazer alguma vida ao filme. Há alguns, como a anfitriã Maitê Proença, que se saem melhor do que outros, mas, no geral, os atores desempenham bem os seus papéis. Até o próprios Domingos, com sua fala meio enrolada, está bem à vontade em seu personagem (que não deixa de ser um alter ego de si próprio).

"Primeiro Dia de um Ano Qualquer" vale por alguns bons momentos, como a hilária participação especial de Ney Matogrosso, mas, no geral, é um filme insosso e que parece ter sido muito mais divertido de se fazer do que é de se assistir.

NOTA: 2.5/5


terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Paixão e Acaso


Dir.: Domingos Oliveira; Escrito por Domingos Oliveira; Com Vanessa Gerbelli, Aderbal Freire Filho, Pedro Furtado. 2012 - Forte Filmes (83 min. - 12 anos)


Inês é uma psicanalista de trinta e tantos anos que, apesar de aconselhar diversas pessoas diariamente, vive um momento bastante complicado de sua vida. Seu pai morreu há três anos e desde então ela não namora mais ninguém e nem faz sexo. Uma noite, porém, o fantasma de seu falecido progenitor aparece e diz a Inês que mais cedo ou mais tarde ela vai se apaixonar. Entretanto, o que ela não esperava é que ela iria se encantar por dois homens ao mesmo tempo, e pior ainda, que eles são pai e filho. Esse é o ponto de partida do novo filme de Domingos Oliveira, "Paixão e Acaso". 

Seguindo a mesma linha dos últimos filmes do diretor, seu novo longa também foi feito com um pequeníssimo orçamento, artifício que Domingos utiliza para poder rodar os filmes que quer, quando quiser, sem ter que se submeter ao exaustivo processo de captação de verba. Essa prática, porém, é uma faca de dois gumes. Por um lado, o diretor não fica na mão de produtores nem burocracias governamentais, por outro, seus filmes tem uma produção bastante precária.

Tecnicamente falando, "Paixão e Acaso" é uma verdadeira desgraça! O trabalho de fotografia é bastante simples, o que por si só não constitui um problema, porém a forma como ele é feito é demasiadamente desleixado. Sobram momentos durante os 83 minutos de projeção do longa em que a iluminação é péssima ou, então, muda repentinamente. Por exemplo, num instante ela é mais escura, dá um corte, e do nada ela fica mais clara, só para então haver mais um corte e ela voltar a ficar mais escura novamente.

A edição também é deplorável, rendendo erros de continuidade bem explícitos e cenas mal-cortadas, daquelas em que os personagens estão na sala e de repente estão no quarto. Há também o artifício comum de Domingos em editar conversas usando transições. Não sei por que a insistência nisso, o resultado fica ruim, dando a impressão de que o bate-papo dos personagens não interessa, mas sim apenas trechos dele. É quase um compacto, só que ao invés de gols de uma partida de futebol ou desfiles de escola de samba, temos pedaços de um diálogo.

Além disso, há a inserção de músicas fora de hora ou de forma totalmente incompetente e a captação de som também deixa a desejar. Enfim, já vi trabalhos de vídeo de estudantes colegiais feitos no Windows Movie Maker com edição de som e imagem bem melhor do que a desse longa, que tinha à sua disposição uma equipe técnica e equipamentos profissionais.

Entretanto, compensando a pobreza da produção, "Paixão e Acaso" possui um elenco bastante competente. A protagonista, Vanessa Gerbelli, é bastante carismática e tem um desempenho muito bom, assim como seus companheiros de cena, os atores Pedro Furtado e Aderbal Freire Filho. Sem dúvida alguma, o trio principal merecia um filme muito melhor do que o entregue por Domingos Oliveira.

Quanto ao roteiro, ele é falho. Ao longo da história há alguns bons momentos, como as sessões de análise de Inês, porém, no geral, os elementos sobrenaturais da narrativa não combinam com a parte realista da história, deixando bem claro a origem teatral do texto (o filme é uma adaptação da peça "Turbilhão" do próprio Domingos Oliveira), onde, sem dúvidas, esse realismo fantástico deve funcionar de forma muito mais eficiente. O longa também em diversos momentos perde o foco, fazendo com que a trama principal ceda espaço para narrativas secundárias, resultando em vários eixos narrativos pouco desenvolvidos. Além disso, há personagens que poderiam ter sido facilmente retirados, como a mãe/esposa fantasma de Bento e Fábio (os dois pretendentes de Inês) e o narrador, ambos não trazendo nada de importante para a história.

"Paixão e Acaso" tem uma produção pobre e um roteiro distante do ideal, sendo nem muito engraçado, porém o bom elenco faz com que o filme consiga ser, no mínimo, aceitável. Está longe de merecer uma recomendação, porém não chega a ser uma tortura também.

NOTA: 2.5/5


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Behind the Candelabra


Dir.: Steven Soderbergh; Escrito por Richard LaGravenese; Com Michael Douglas, Matt Damon, Dan Aykroyd, Rob Lowe. 2013 - HBO Films (118 min. - 16 anos)


Como já se sabe, Steven Soderbergh decidiu ausentar-se do cinema por tempo indeterminado para poder se dedicar à sua carreira de pintor. Logo após esse anúncio veio a curiosidade de toda a comunidade cinéfila em saber quais seriam os últimos longas do diretor antes de sua aposentadoria. Seus dois trabalhos de 2012, o longa de ação "À Toda Prova" e a comédia dramática "Magic Mike" eram bons, mas não deixavam de ser decepcionantes. Para 2013, Soderbergh preparou dois filmes, sendo o primeiro deles o thriller "Terapia de Risco", uma história que começa boa, mas que termina de um jeito desastroso. Porém, como não é burro nem nada, Soderbergh deixou o melhor para o final, a deliciosa cinebiografia de Liberace "Behind the Candelabra".

Lançado como telefilme da HBO (nenhum estúdio quis bancar o projeto por ser "gay demais"!), "Candelabra" tem como personagem principal, na verdade, Scott Thorson, um treinador de animais que de uma hora para outra tem a sua vida completamente modificada. Tudo isso acontece quando, em um bar, Scott conhece Bob Black, um amigo do mais famoso pianista norte-americano, Liberace.

Um dia, então, Bob leva Scott a um show de Liberace e, em seguida, o leva ao camarim do artista, quando fica claro que o renomado músico quer mais do que apenas um aperto de mão do jovem. A partir daí, Scott vai ficando cada vez mais íntimo de Liberace até que os dois finalmente engatam um relacionamento, e é exatamente esse período - mais especificamente, seis anos - que o filme aborda.

Em primeiro lugar, deve-se louvar as performances dos dois protagonistas do longa. Como Liberace, Michael Douglas arrasa nos trejeitos, no jeito de falar, no caminhar... Enfim, ele literalmente incorpora o pianista e faz dessa uma das melhores atuações de sua carreira. Não é por nada que ele ganhou o Emmy de melhor ator por seu desempenho e posso apostar que caso o filme tivesse sido exibido nos cinemas, ele seria um candidato certo ao Oscar também. Em poucas palavras, é simplesmente o tipo de performance que não dá para esquecer tão facilmente. Daí entende-se porque Soderbergh fez questão de esperar Douglas terminar o tratamento de seu câncer para só então rodar o filme.

Porém, apesar de Douglas roubar a cena, Matt Damon também está excelente como Scott. É, sem dúvida, uma performance mais contida do que a de Douglas, mas mesmo assim não é menos competente. Seu personagem passa por diversos altos e baixos durante o filme, o que faz com que Damon tenha que saber lidar com as transições entre o drama e a comédia, e ele se sai extremamente bem nesse aspecto, não caindo em nenhum momento na caricatura ou no melodrama.

Entretanto, vale a pena ressaltar também a breve, mas hilária participação de Rob Lowe como o dr. Jack Startz, cirurgião plástico de Liberace. O personagem é extremamente difícil, uma vez que poderia ter facilmente caído na chanchada, afinal o sujeito tem o rosto lotado de botox e possui um bronzeado visivelmente falso, porém Lowe é o destaque sempre que aparece e, ainda, evita exagerar mais do que o papel exige.

Como estamos falando de um filme de Steven Soderbergh, não há como não falar de seu trabalho de fotografia sob o pseudônimo de Peter Andrews. Adotando uma palheta amarelada para as cenas internas, o diretor realça o luxo e a exuberância da vida levada pelo pianista, porém nas cenas dos shows, Soderbergh resolve dar ênfase ao brilho excessivo das peças do figurino de Liberace, adotando, portanto, um visual mais convencional, mas com uma iluminação mais forte. A única ressalva é ao uso da câmera na mão em alguns momentos do último ato. Apesar do recurso ser usado para intensificar a sensação de insegurança de Scott Thorson num trecho bem tenso da história, o tremelique da câmera não combina com a técnica adotada no resto do filme, ficando deslocado no contexto geral.

Elogios ainda devem ser feitos ao trabalho da figurinista Ellen Mirojnick, que já havia trabalhado antes em projetos bastante kitsch, como "Tropas Estelares" e "Showgirls", ambos do holandês Paul Verhoeven. Isso obviamente colaborou para o seu excelente trabalho em "Behind the Candelabra", no qual reproduziu com fidelidade diversos trajes de Liberace, como também criou novas peças de vestuário para os outros personagens do filme. Há também a produção de arte impecável do trio Howard Cummings, Patrick M. Sullivan Jr. e Barbara Munch, que trazem para a tela o mundo cafona de Liberace, e o importantíssimo trabalho de maquiagem, muito bem realizado.

O roteiro de Richard LaGravenese é impecável. Os diálogos são muito bem escritos e a história é contada de uma forma fluente, sem parecer apenas uma sucessão de fatos, mas sim uma conturbada e interessantíssima história de amor acompanhada de observações sobre a cultura da celebridade, a importância dada à idade pela sociedade contemporânea e a questão da homossexualidade, que nos anos 1980 - período no qual o filme é ambientado -, ainda era tabu, mas que vinha sendo empurrado com urgência para uma sociedade conservadora devido ao advento da AIDS.

Embalado por uma ótima trilha sonora de Marvin Hemlisch, em seu último trabalho antes de sua morte em agosto de 2012, "Behind the Candelabra" pode ser considerado desde já um dos filmes mais interessantes de 2013 e um canto do cisne respeitável para o diretor Steven Soderbergh.

NOTA: 4/5


terça-feira, 12 de novembro de 2013

Minha Vida Dava um Filme (Girl Most Likely)


Dir.: Shari Springer Berman e Robert Pulcini; Escrito por Michelle Morgan; Com Kristen Wiig, Annette Bening, Matt Dillon, Darren Criss. 2012 - Paris Filmes (103 min. - 12 anos)


O lançamento de "Minha Vida Dava um Filme" nos cinemas brasileiros é realmente surpreendente. Mesmo sendo exibido apenas em circuito limitado, o filme é uma receita certa para o fracasso comercial no Brasil. É uma dramédia (drama com comédia) tipicamente americana com um elenco longe de ser garantia de sucesso, dirigida por realizadores conhecidos apenas no circuito independente e que foi mal de bilheteria até mesmo em sua terra natal.

Porém, não resisti à tentação e fui conferir o filme por dois motivos. O primeiro é que a protagonista é interpretada por Kristen Wiig, ótima comediante egressa do Saturday Night Live e que fez sucesso há dois anos com "Missão Madrinha de Casamento", longa que estrelou e co-escreveu (este último cargo rendendo-lhe uma indicação ao Oscar). Além disso, há também a presença da excelente atriz Annette Bening como a mãe da personagem de Wiig. Em segundo lugar, a dupla de diretores responsável pelo longa, Shari Springer Berman e Robert Pulcini, dirigiu algumas comédias bastante inofensivas, mas bem divertidas, como "Os Acompanhantes" e o novo clássico da Sessão da Tarde, " O Diário de uma Babá".

Enfim, com esses nomes envolvidos, sabia que mesmo se o filme não fosse grandes coisas, eu iria acabar me divertindo. Porém, nada me preparava para o pior. "Minha Vida Dava um Filme" é um verdadeiro desastre e não merecia nem passar perto de uma tela de cinema.

O filme acompanha uma mulher de trinta e tantos anos chamada Imogene. Nascida em New Jersey, Imogene se mandou para Manhattan assim que pôde, uma vez que sentia vergonha de sua mãe viciada em jogo e de seu irmão pouco sociável e viciado em crustáceos. Ao chegar a Nova York, ela se torna uma promessa da dramaturgia norte-americana, porém por um azar tremendo, essa promessa nunca se concretiza e ela acaba se tornando uma espécie de namorada-troféu de um jovem bem abastado e escritora de sinopses de peças de teatro para uma revista.

Entretanto, quando ela espera finalmente se casar com o seu "namorido", ele lhe dá um pé na bunda e exige que ela retire as suas coisas de dentro do apartamento onde moram. Paralelamente a isso, Imogene perde o emprego na revista quando ela começa a fazer o seu trabalho do jeito que ela quer e não como a sua chefe manda.

Por causa disso tudo, Imogene resolve tomar uma medida drástica: inventar um falso suicídio para, pelo menos, reaver o seu namorado de volta e, assim, não ficar na sarjeta. Porém, o plano dá errado e todos acabam levando a sério o seu "suicídio", obrigando-a a ficar sob a observação de sua mãe, fazendo com que ela volte para New Jersey e lá fortaleça os laços com sua família e também descubra um surpreendente segredo.

Sim, a história é nada inventiva (a não ser pelo falso suicídio), porém no já citado "O Diário de uma Babá", a dupla Springer Berman-Pulcini conseguiu pegar uma premissa bem boba e transformá-la em um filme com um ótimo senso de humor e sacadas bastante pertinentes. Porém, aqui parece que isso se perdeu. Apesar de ter vários pontos em comum com os outros projetos dos diretores, em especial os personagens extravagantes, "Minha Vida Dava um Filme" parece uma versão piorada dos longas anteriores da dupla.

Em primeiro lugar, o pontapé do enredo - o tal "suicídio" - não faz muito sentido. Tudo bem que a protagonista está passando por um momento difícil em sua vida, mas tudo acontece rápido demais, de forma que esse aspecto da história pareça mais bobo e idiota do que a roteirista Michelle Morgan e os diretores queriam que parecesse, uma vez que não é dado tempo o suficiente para o espectador acreditar na intenção que faz com que Imogene cometa essa loucura.

Continuando no roteiro, o texto de Morgan é de uma ruindade atroz. A família da protagonista é bem disfuncional, mas até aí tudo bem, afinal não faltam filmes bons sobre famílias disfuncionais. Porém, a roteirista erra a mão diversas vezes ao apresentar esse grupo de personagens. Zelda, a mãe de Imogene, é dentre os "loucos" do filme, a figura mais interessante e crível também. Entretanto, Morgan não dá à personagem tempo o suficiente para mostrar uma outra faceta, mais sensível e mais pé-no-chão, transformando-a em uma mera caricatura. Além disso, a relação de Zelda com a filha poderia ter sido mais bem explorada pelo roteiro. O irmão de Imogene, Ralph, também é outro personagem deplorável. Ele claramente sofre de alguma doença (autismo, talvez?), tanto que apresenta uma série de comportamentos bem curiosos, porém tudo é tratado de forma tão superficial pela roteirista que Ralph se torna um personagem irritante de tão estereotipado que é. Porém, o pior de todos os familiares de Imogene é o novo namorado de sua mãe, um homem com a alcunha de George Bousche. O nome do personagem é uma piada sem graça e datada em alguns anos e toda a história de ele ser um agente secreto da CIA é tão ruim que nem numa sitcom de quinta categoria seria engraçado. Surpreende também o quanto esses personagens são mal administrados pelos diretores, que conseguiram fazer um trabalho muito melhor em "Os Acompanhantes", um filme no qual não faltam tipos estranhos.

O elenco, felizmente, consegue ficar um dedo acima da desgraça que é o filme. Kristen Wiig faz o possível com Imogene, porém a personagem é uma mulher chata demais, o que dificulta a sua identificação com o público. Matt Dillon e Christopher Fitzgerald, como Bousche e Ralph, fazem de tudo para tornar seus personagens um pouco menos pobres e mal-acabados. Darren Criss, interpretando um jovem que aluga o quarto de Imogene e que se torna um interesse romântico da protagonista, está bem e mostra que, por incrível que pareça, somente o seu personagem em "Glee" (Blaine) é um chato de galocha e não ele em si. Por fim, Annette Bening se mostra a melhor coisa do filme. Apesar de ter que lidar com uma personagem ruim e que tinha muito mais potencial tanto cômico quanto dramático, Bening se sobressai e mostra que poderia ter feito uma performance ainda melhor caso a sua personagem fosse mais bem construída.

Em nenhum momento "Minha Vida Dava um Filme" parecia ser um dos melhores filmes do ano, porém chega a ser inacreditável o quão ruim ele é. A combinação de piadas batidas, com caracterização simplória e situações ridículas (vide o final vergonha-alheia-é-pouco), faz desse um dos piores filmes do ano com facilidade. Poderia ter sido uma sitcom interessante, mas como longa-metragem... é melhor deixar escondido numa prateleira no fundo da locadora.

NOTA: 1.5/5


terça-feira, 8 de outubro de 2013

Elysium (Elysium)


Dir.: Neill Blomkamp; Escrito por Neill Blomkamp; Com Matt Damon, Jodie Foster, Sharlto Copley, Alice Braga, Wagner Moura, Diego Luna. 2013 - Sony (109 min. - 16 anos)


"Distrito 9", primeiro longa-metragem do diretor Neill Blomkamp, conseguiu surpreender a todos em 2009, quando se tornou um enorme sucesso de público e crítica ao contar uma história de ficção-científica recheada de efeitos especiais (que deram ao filme, orçado em apenas US$30 milhões, ares de super produção) e com um convincente pano de fundo social, comparando a situação dos aliens que habitam a área que dá nome ao filme àquela vivida pelos negros durante o apartheid sul-africano. Quatro anos depois, Blomkamp retorna com seu novo filme, "Elysium", e a Síndrome do Segundo Filme é facilmente perceptível em todo ele.

Assim como em seu excelente longa de estreia, o diretor apostou aqui em um enredo que mistura a ação e as máquinas dos filmes sci-fi ao uma reflexão social pertinente. No caso de "Elysium", o ano é 2154 e o futuro é extremamente distópico. A Terra, devido à intensa exploração de seus recursos naturais, encontra-se sem um único resquício de verde e sua atmosfera abriga uma permanente nuvem de poluição. As cidades se transformaram em favelas gigantescas, não só em sua arquitetura, mas em sua qualidade de vida também: as condições de saneamento e higiene são péssimas, os índices de criminalidade estão altíssimos e os hospitais encontram-se sobrecarregados.

Porém, em oposição à miséria terrestre, sobrevoa sobre o planeta uma belíssima estação espacial chamada Elysium. É esse o lugar para onde os ricos fugiram quando a situação na Terra saiu do controle e tornou-se irreversível. Lá, graças a uma espécie de "cama curativa", ninguém fica doente nem envelhece. Enfim, é um verdadeiro paraíso. Porém, para manter esse habitat intacto e em pleno funcionamento, são adotadas medidas extremamente rígidas contra a invasão de habitantes da Terra, incluindo o abate de foguetes trazendo pessoas buscando curas para doenças que não podem ser tratadas em solo terrestre.

É nesse ambiente que conhecemos Max, um operário que constantemente entra em conflito com a lei, mesmo que nem sempre essa seja a sua intenção. Porém, após sofrer um grave acidente de trabalho que o deixa com altos níveis de radiação no corpo (o que lhe implica apenas mais três dias de vida), ele decide ir até Elysium para conseguir se curar. Para isso, ele conta com a ajuda de um chefe do crime organizado, que também possui seus interesses na invasão da famosa base espacial, e de uma amiga sua de infância, cuja filha sofre de leucemia e que também busca a sua cura em Elysium. Entretanto, a Secretária de Segurança da base juntamente com um agente de campo clandestino farão de tudo para impedir a chegada deles à Elysium.

Pelo lado positivo, Elysium tem a sua ótima produção. Os efeitos especiais são de primeira linha, a direção de arte de Peter Lando é muito bem feita, os figurinos de April Ferry idem e a fotografia de Trent Opaloch também merece elogios. O filme custou US$115 milhões, mas é tão bem realizado que parece que o orçamento foi ainda maior.

Ainda nos elogios, não há dúvidas de que a premissa de "Elysium" é bastante ambiciosa, especialmente no que diz respeito às suas alegorias. Nas entrelinhas, o longa usa o seu enredo para discutir diversos assuntos, como imigração, desigualdade social, degradação ambiental etc. Em outras palavras, o diretor mostrou ainda ter a preocupação apresentada em "Distrito 9": a de entreter, mas ao mesmo tempo, fazer refletir; e por isso, merece méritos.

Porém, o filme não vai muito além disso em suas qualidades. Se a sua premissa é bem interessante e cria uma grande expectativa, o roteiro em si é uma decepção só. O enredo é até bem construído, mas falta a ele personagens envolventes e uma história que faça jus ao seu argumento intrigante. Além disso, há alguns pontos na narrativa que não fazem o menor sentido, como por exemplo, o fato de os habitantes de Elysium não envelhecerem. Se eles, basicamente, são semi-imortais, não vai chegar uma hora em que a base espacial vai sofrer de superpopulação, assim como a Terra? Se Elysium tem uma estrutura administrativa tão avançada, como é que ninguém nunca pensou nisso? Vai entender...

Outro ponto que me incomodou bastante não só no roteiro, mas no filme como um todo, foi a esteriotipização das duas classes da sociedade. Todos os ricos do filme são maus e, simplesmente, não fazem nada na vida a não ser ficar bebendo drinques ao parapeito da varanda ou tomando banho de sol. Isso sem contar que eles estão sempre fazendo festas em seus jardins sem nenhum motivo aparente. Por outro lado, os pobres são todos uns coitados explorados covardemente pela classe dominante. Enfim, não quero dizer que não haja traços disso na nossa sociedade, mas um filme que se considera tão sério não deveria fazer generalizações tão arriscadas e maniqueístas.

Falando no roteiro, vamos aos personagens. Que bagunça! Em muitos momentos, parece que estamos assistindo a filmes completamente diferentes. De um lado, há personagens mais realistas, de comportamento mais sutil, como o próprio personagem principal, Max, a sua colega e pretendente Frey e seu melhor amigo Julio. Não é por nada que os seus intérpretes, Matt Damon, Alice Braga e Diego Luna, respectivamente, deem as melhores atuações do longa. Mas por outro lado, há uma gama de personagens caricatos, que parecem ter acabado de sair de uma revistinha em quadrinhos de quinta categoria. Os vilões Delacourt (a Secretária de Segurança de Elysium), Kruger (o agente de campo) e John Carlyle (dono da empresa em cuja fábrica Max trabalha) junto com o bandido-amigo Spider são um desastre em caracterização. Por conseguinte, Jodie Foster (com uma aparência à la Christine Lagarde), Sharlto Copley, William Fitchner e Wagner Moura estão bem ruinzinhos. Copley e Moura, então, parecem saídos de desenhos dos Looney Tunes. Enfim, Blomkamp nunca se decide que caminho vai seguir, e com isso, acaba criando um filme com crise de identidade.

Como se isso já não fosse o bastante, o diretor, além de ter mão-pesada para dirigir atores, também exagera em alguns de seus floreiros estilísticos, especialmente a câmera lenta. O tempo inteiro, Blomkamp desacelera o filme para poder mostrar em todos os detalhes a emoção dos personagens ou corpos explodindo. Exagero é pouco para definir.

No geral, "Elysium" não é ruim. Porém, não deixa de ser triste sentir que o filme poderia ter sido infinitamente melhor, caso alguns pontos fossem melhorados - a escolha de um foco, principalmente. Dizem que a prova real de qualquer diretor é o terceiro filme, portanto, vamos torcer que, em seu próximo projeto, Blomkamp aprenda com os erros de sua segunda empreitada no cinema.

NOTA: 2.5/5


domingo, 6 de outubro de 2013

O Mordomo da Casa Branca (Lee Daniels' The Butler)


Dir.: Lee Daniels; Escrito por Danny Strong; Com Forest Whitaker, Oprah Winfrey, David Oyelowo, Cuba Gooding Jr., Lenny Kravitz. 2013 - Diamond Films (132 min. - 14 anos)


O diretor Lee Daniels, por ser negro e homossexual assumido, tem uma grande preocupação em fazer filmes sobre minorias, afinal ele integra duas delas. Em seu projeto de maior prestígio, "Preciosa - Uma História de Esperança", ele contou a saga de uma jovem negra, pobre e obesa que sofre o pão que o Diabo amassou. Em seu longa seguinte, "Obsessão", o diretor usou um enredo de filme policial para analisar a discriminação racial no interior da Flórida. Agora, em "O Mordomo da Casa Branca", Daniels faz um filme bem mais leve e acessível (o que chega a ser surpreendente), mas nem por isso abandona a questão racial norte-americana, tratada aqui de forma mais ampla do que em seus filmes anteriores.

O filme começa com Cecil Gaines, ainda criança, trabalhando numa fazenda de algodão no Sul dos EUA, junto de seus pais. Porém, quando a mãe de Cecil é estuprada pelo capataz da plantação, seu pai vai tirar satisfação e acaba sendo assassinado na sua frente. Com pena do menino, a idosa dona da fazenda decide trazê-lo para dentro da casa e torná-lo um mordomo. Com o passar dos anos, Cecil aprende como servir, como tratar os seus patrões e, principalmente, como se fazer invisível perante a presença dos brancos. Entretanto, chega o momento em que o jovem decide fugir da fazenda e ir para o Norte do país.

Assim, depois de vagar por diversas cidades e invadir uma confeitaria para conseguir comer, onde acaba trabalhando por alguns anos, Cecil consegue um emprego no Hotel Excelsior em Washington D.C., o que depois o levará a trabalhar na Casa Branca. E assim, Cecil Gaines serve sete presidentes norte-americanos (de Einsenhower até Reagan) e, em paralelo, vê as mudanças pelas quais o seu país sofre.

Baseado num artigo do jornal The Washington Post que narra a vida de Eugene Allen, figura que serve de inspiração para o personagem Cecil Gaines, "O Mordomo da Casa Branca" está bem longe de ser um filme original. Ao contrário disso, o longa segue com rigor a cartilha das biografias cinematográficas. Porém, não é isso que faz o filme menos interessante.

A começar pelas ótimas interpretações do elenco. Forest Whitaker está muito bem como o protagonista da história, numa interpretação contida, mas ainda assim, bastante envolvente e sensível, de fácil identificação com o público - seja ele negro ou não. Oprah Winfrey, em seu primeiro papel no cinema desde "Bem-Amada" de 1998, está ótima como Gloria, a esposa alcoólatra e infiel, mas ao mesmo tempo, parceira de Gaines. Pode apostar que a sua performance, aliada à sua fama como a grande apresentadora da tevê americana, vão lhe garantir diversas indicações na próxima temporada de prêmios. David Oyelowo, que já havia mandado muito bem no filme anterior de Daniels, "Obsessão", aqui tem outra ótima atuação como o filho ativista do protagonista. O personagem de Oyelowo, Louis, poderia ter facilmente caído na caricatura do jovem revolucionário, porém o ator, com bastante competência, conseguiu impedir que isso acontecesse.

No rol dos personagens secundários, se destacam Cuba Gooding Jr. e Lenny Kravitz como Carter e James, colegas de trabalho de Cecil. Há ainda, uma quantidade enorme de participações especiais que incluem Vanessa Redgrave (numa rápida aparição como a dona da fazenda de algodão), Mariah Carey (que entra muda e sai calada como a mãe de Cecil), Jane Fonda (em apenas duas cenas, vivendo Nancy Reagan), Terrence Howard (interpretando o vizinho da família Gaines), e como os presidentes, Robin Williams (discreto, como Einsenhower), James Marsden (simpático, como JFK), Liev Schreiber (hilário, como Lyndon Johnson), John Cusack (competente como sempre, vivendo Nixon) e Alan Rickman (muito bom, como Reagan).

O filme também possui outras qualidades, como a reconstituição de época, fruto da direção de arte de Tim Gavin e Diane Lederman e do figurino de Ruth E. Carter, e a bonita trilha sonora, composta pelo português Rodrigo Leão.

O roteiro de Danny Strong, por sua vez, chama a atenção pelo tratamento cuidadoso que dá à história. O filme poderia ter sido apenas mais uma biografia episódica e didática, que não se dá ao trabalho de trazer discussões pertinentes para a tela. Porém, Strong fez o certo, e sabendo que estava tratando de um assunto de extrema importância para a história norte-americana, decidiu escrever um roteiro que constantemente mostra os dois lados da moeda da luta pelos direitos civis dos negros. Daí a enorme importância de se ter como protagonista um funcionário da Casa Branca, uma vez que é ele quem faz a ponte entre a luta nas ruas (representada por Louis, o filho revolucionário) e o que todos esses movimentos significam para a política do país (estampada na figura dos presidentes). Enquanto isso, Cecil, que se encontra entre esses dois mundos, sintetiza a figura do negro americano comum, dividido entre o desejo de ter os mesmos direitos que os brancos e a preocupação com a sua própria segurança em meio a um cenário violento de guerra ideológica. Ao adotar essa postura, o roteiro de Strong se mostra parcial (totalmente a favor das liberdades civis), mas ao mesmo tempo, foge do maniqueísmo do "branco mau versus o negro vitimado". Um acerto que faz toda a diferença entre "O Mordomo da Casa Branca" e outros filmes que tratam do mesmo tema. Porém, não deixa de ser decepcionante, após todo o equilíbrio apresentado, chegar ao final do filme e ter que aguentar um discurso demasiadamente pró-Obama. Tudo bem que ele foi o primeiro presidente negro eleito na história dos EUA, o que faz dele uma figura importante e que deveria ser citada de qualquer jeito no filme, mas todo mundo sabe que o governo Obama está longe de ser algo unânime, até mesmo entre os americanos.

Bem dirigido e com um elenco invejável e em muito boa forma, "O Mordomo da Casa Branca" com certeza vai encontrar seus detratores, que dirão que o filme é apenas mais uma propaganda da "liberdade" e da "democracia" norte-americanas. Porém, há o outro grupo, no qual me incluo, que dirão que o filme de Lee Daniels é uma aula de História divertida e bem contada.

NOTA: 4/5



Como não Perder essa Mulher (Don Jon)


Dir.: Joseph Gordon-Levitt; Escrito por Joseph Gordon-Levitt; Com Joseph Gordon-Levitt, Scarlett Johansson, Julianne Moore, Tony Danza. 2013 - Imagem Filmes (90 min. - 14 anos)


Como seu apelido já deixa bem claro, Jon é um verdadeiro mulherengo, um ímã de mulheres em pessoa. Ele vai à sua boate favorita, escolhe a mulher que mais lhe atrai (sem não antes classificá-la em uma escala de 1 a 10), dança sensualmente com ela, fica com ela pelos cantos, e por fim, a leva para sua casa. Além do sexo, Jon é apaixonado por seu corpo, por seu apartamento, por sua família, por seu carro, pela Igreja, por seus amigos, pelas mulheres e, principalmente, pela pornografia. Não há um dia sequer em que ele não entre em diversos sites de sacanagem e se masturbe várias vezes.

Até aí, tudo bem. Afinal, cada um faz o que quer de sua vida. Porém, tudo muda quando Jon encontra a sua garota número 10, a voluptuosa Barbara Sugarman. Entretanto, ela é difícil. Não, ele não consegue levar ela para casa de primeira, pelo contrário, Bárbara é daquelas mulheres que se leva para jantar e também ao cinema. Enfim, Barbara é a mulher que Jon nunca imaginaria encontrar. Porém, só há uma coisa no meio do caminho para o final feliz: o vício de Jon em pornografia.

Estreia na direção do ator Joseph Gordon-Levitt, "Como não Perder essa Mulher" (vai entender esse título...) busca trazer originalidade ao gênero da comédia romântica. O filme fala abertamente sobre sexo e mostra (quase sem pudor) cenas de filmes pornô, o que por si só já o faz diferente da safra recente de comédias românticas hollywoodianas. Além disso, ao contar a história do ponto-de-vista de um homem, o longa também se destaca, uma vez que, geralmente, as histórias do gênero são protagonizadas por mulheres. Em poucas palavras, Gordon-Levitt quis fazer uma comédia romântica que os homens tivessem vontade de ver e com a qual eles pudessem se identificar.

A intenção é nobre, mesmo que o filme como um todo não faça jus a isso. Apesar de ser uma comédia, "Como não Perder essa Mulher" não é especialmente engraçado, ao contrário, talvez tente ser engraçado até demais. O filme possui, sim, os seus momentos genuinamente cômicos, como quando Jon sai pela primeira vez com Barbara, mas na maior parte, o longa é mais curioso do que realmente engraçado.

O filme peca também ao pesar demais a mão na história da pornografia. Tudo bem que esse é o grande vício do protagonista, porém, após um determinado momento, essa história toda começa a cansar. O diretor insiste em usar periodicamente ao longo do filme imagens e mais imagens de filmes pornô. Tem de tudo: cachorrinho, cowboy, sexo oral, cunete... Enfim, fica um pouco demais, desnecessário até.

Por outro lado, por ser, em primeiro lugar, ator, Gordon-Levitt consegue tirar o melhor de seu elenco. Ele mesmo está bem como o protagonista da história, mas além dele há também performances bastante interessantes de Tony Danza e Glenne Headley como os pais de Jon, e de Brie Larson, vivendo a irmã entediada e que dá mais atenção ao seu celular do que aos seus familiares. Há ainda Julianne Moore, como uma colega de faculdade de Jon, mais uma vez mostrando o porquê dela ser uma das melhores atrizes da atualidade. Não é uma grande performance dela, mas nem por isso ela não é competente e cumpre bem o seu papel.

Porém, a grande estrela do filme é Scarlett Johansson! A atriz, que sempre fez questão de mostrar suas curvas nos tapetes vermelhos, aqui faz de Barbara Sugarman uma das melhores personagens de sua carreira. Falando com um sotaque típico de New Jersey, fazendo poses cheia de desenvoltura e usando roupas que deixariam qualquer periguete morrendo de inveja, Johansson demonstra o seu ótimo timing cômico e faz uma dupla muito boa com Gordon-Levitt. Enfim, o filme já valeria só pela performance dela.

Apesar de estar longe de figurar entre as melhores comédias românticas, "Como não Perder essa Mulher" consegue superar, em parte, as suas falhas graças ao seu elenco afinado e às sacadas inteligentes de seu roteiro. Enfim, estou curioso para ver o que Joseph Gordon-Levitt nos trará a seguir.

NOTA: 3/5



segunda-feira, 30 de setembro de 2013

A Garota das Nove Perucas (Heute Bin Ich Blonde)


Dir.: Marc Rothemund; Escrito por Kati Eyssen; Com Lisa Tomaschewsky, David Rott, Karoline Teska, Jasmin Gerat. 2013 (115 min. - 14 anos)


O câncer é uma doença cada vez mais em voga nas discussões das pessoas. Talvez não haja uma única pessoa no mundo que não conheça outra que tenha câncer. Entretanto, é inegável que hoje em dia é mais fácil sobreviver à doença graças aos tratamentos, cada vez mais modernos. Porém, o câncer continua sendo uma doença tabu e que, sem dúvida alguma, ainda chama bastante atenção, especialmente quando o enfermo já tem a cabeça raspada. É a partir dessa constatação que saiu a história de "A Garota das Nove Perucas".

O filme tem como protagonista Sophie, uma jovem de 21 anos, recém-ingressa na universidade, que descobre que sofre de um câncer da pleura pulmonar raro e bastante agressivo. Consequentemente, o que se segue é um doloroso tratamento que fará Sophie mudar completamente de vida. Porém, quando seu cabelo começa a cair e ela decide raspar a cabeça, a jovem percebe que dessa situação aparentemente sem saída ela pode encontrar uma forma de não só disfarçar a sua doença, mas também de dar uma agitada em seu cotidiano até então resumido ao hospital: comprar perucas e dar a cada uma delas um pseudônimo e uma personalidade diferentes.

Em primeiro lugar, deve-se elogiar a ótima performance de Lisa Tomaschewsky como Sophie. A jovem atriz consegue carregar o filme nas costas, principalmente no primeiro ato, que é mais longo do que devia. Além disso, quando a sua personagem adota as várias personas, Lisa mostra ser uma intérprete versátil e bastante talentosa. Enfim, ela é, na minha humilde opinião, a principal razão de ir assistir ao filme.

O roteiro, porém, não fica atrás. Escrito por Kati Eyssen, baseado na autobiografia de Sophie van der Stap, o filme acompanha de forma realista e nem um pouco sensacionalista todo o tratamento do câncer, desde os primeiros exames até os estágios finais. Além disso, o longa contém diálogos bem escritos, que transitam entre o engraçado e o comovente com muita naturalidade. Mesmo assim, o filme sofre de alguns problemas de ritmo, principalmente no primeiro ato, que como já falei aqui, se estende mais do que devia e que poderia facilmente ter sido encurtado sem comprometer o enredo.

Não há muito mais o que dizer. Em poucas palavras, "A Menina das Nove Perucas" é uma comédia dramática que realmente consegue equilibrar os seus extremos, graças à direção competente de Marc Rothemund, e que merece a sua atenção não só por ser um filme que retrata de forma fiel a luta contra o câncer, mas também por ser simplesmente um bom filme.

NOTA: 3.5/5



domingo, 29 de setembro de 2013

Apenas Deus Perdoa (Only God Forgives)


Dir.: Nicolas Winding Refn; Escrito por Nicolas Winding Refn; Com Ryan Gosling, Kristin Scott Thomas, Vithaya Pansringarm. 2013 (90 min. - 16 anos)


Depois de ganhar o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes 2012 por seu ótimo "Drive" (que até entrou na 7ª posição da lista dos 10 melhores filmes de 2012 aqui do blog), o diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn arranjou para si uma dura missão: superar - ou pelo menos se igualar - ao seu maior sucesso comercial e de crítica. Seu mais novo filme, "Apenas Deus Perdoa", consegue isso? Não. Mas também não dá para dizer que o diretor não continua fazendo filmes interessantes.

Passado inteiramente em Bangcoc, o longa acompanha Julian, um homem americano, dono de uma academia de lutas bancada pelo tráfico de drogas, que resolve se vingar do assassino de seu irmão mais velho, Billy. Entretanto, Julian se comove com a história dele e o deixa vivo. Porém, quem chega à cidade para buscar o corpo do filho mais velho é Crystal, mãe de Julian e chefona de uma rede de tráfico internacional de drogas; e é ela quem vai botar em prática a vingança que Julian não teve a coragem de fazer.

"Apenas Deus Perdoa" funciona, às vezes, quase como um filme mudo, apostando na força de suas imagens para captar os espectadores. E que imagens! A excelente fotografia de Larry Smith é de encher os olhos, recheando a tela com cores fortes e vibrantes como o vermelho e o azul. O que não falta ao filme de Refn são belas imagens, já que até mesmo os mais grotescos atos de violência (que não são poucos) recebem um cuidado estético invejável.

Falando na violência, essa é pesadíssima! Até me surpreendi com a classificação 16 anos do filme. Tem de tudo que você imaginar: olho furado, garganta cortada, face deformada, braço amputado. Em outras palavras, quem tem coração fraco não deve nem passar perto do cinema. Entretanto, vale ressaltar, que apesar das brutalidades cometidas no filme parecerem, num primeiro momento, gratuitas, elas, na verdade, servem apenas para corroborar a mensagem do filme de que o crime não compensa. Melhor viver pobre e morrer tarde do que viver rico e morrer cedo.

A trilha sonora de Cliff Martinez é outro triunfo. Em "Drive", a parceria entre Refn e Martinez já tinha dado super certo. Aqui, ela é mais uma vez bem-sucedida, passando a emoção certa que as cenas exigem, especialmente naquelas que correm sem nem um diálogo travado - o que não é raro.

Quanto às atuações, Ryan Gosling faz mais do mesmo. Não está ruim, mas também não deixa fortes impressões. Na verdade, seu personagem, Julian, poderia ter sido muito mais bem explorado do que é durante o filme, já que ele é um criminoso sanguinário, mas que demonstra, no fundo, ter algum resquício de escrúpulos. Enfim, foi uma oportunidade perdida.

Por outro lado, Kristin Scott Thomas e Vithaya Pansringarm arrasam em papéis que, sim, flertam e muito com o exagero e com a caricatura, mas sinto que essa foi mesmo a intenção do diretor. Thomas, num visual Donatella Versace dos infernos, tem as melhores falas de todo o filme, seja quando arma barraco na recepção do hotel onde está hospedada, seja quando acaba com a moral do filho num jantar. A personagem não tem censura nenhuma e a atriz aproveita isso para fazer de Crystal uma figura memorável. Já Pansringarm, interpretando o grande "vilão" (como se os mocinhos também não o fossem...) da história, um policial corrupto que vive carregando pra lá e pra cá uma espada para matar seus oponentes, dá o seu melhor no papel. Carregando quase que uma mesma expressão durante todo o filme, ele faz rir, como nos momentos em que canta karaokê para oficiais fardados, mas também nos faz morrer de tensão cada vez que saca a sua amada espada.

"Apenas Deus Perdoa" parece uma daquelas "pulp fictions". É curto (tem apenas 90 minutos de duração), tem uma história bem simples, personagens extravagantes e litros e litros de sangue. Talvez, se fosse um filme mais convencional em certos aspectos, teria sido ainda mais atraente, porém, mesmo com seus floreios por vezes desnecessários, o novo filme de Nicolas Winding Refn reserva para si um estilo único e uma experiência, no mínimo, diferente.

NOTA: 3.5/5