domingo, 28 de abril de 2013

O Abismo Prateado


Dir.: Karim Aïnouz; Escrito por Karim Aïnouz e Beatriz Bracher; Com Alessandra Negrini, Thiago Martins, Otto Jr. 2011 - Vitrine Filmes (83 min. - 14 anos)


"Quando você me deixou, meu bem/Me disse pra ser feliz e passar bem/Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci/Mas depois, como era de costume, obedeci/Quando você me quiser rever/Já vai me encontrar refeita, pode crer/Olhos nos olhos, quero ver o que você faz/Ao sentir que sem você eu passo bem demais". Nas duas primeiras estrofes da canção "Olhos nos Olhos" de Chico Buarque, vemos o desenrolar de muitas separações. Ocorre primeiro o estágio da negação, aquele em que o indivíduo abandonado não aceita o fim do relacionamento. Depois, acontece o momento em que a pessoa aceita a separação, mas ainda não a aceita. Até que, finalmente, na terceira etapa, o indivíduo percebe que não adianta chorar pelo leite derramado e decide dar a volta por cima e continuar a viver a vida normalmente. Em poucas palavras, é essa a história de "O Abismo Prateado", que não à toa foi baseado na composição de Chico.

No longa de Karim Aïnouz, realizador de "Madame Satã" e "O Céu de Suely", Violeta é uma dentista que possui um filho saudável e um casamento, aparentemente, feliz. Porém, a casa cai quanto Djalma, seu marido, deixa uma mensagem no celular dela, dizendo que não a ama mais e pior, que se sente sufocado por ela. Obviamente, Violeta fica desconsolável e decide ir atrás do marido, que pegou um avião para Porto Alegre.

Ela se dirige, então, já tarde da noite, ao aeroporto para comprar a passagem para o próximo voo. Porém, este só sai às seis e meia da manhã do dia seguinte, obrigando-a a fazer algo enquanto espera a hora de embarcar. Nesse meio tempo, ela perambula pelas ruas do Rio de Janeiro, remoendo as palavras fortes usadas por Djalma para terminar o casamento de anos e conhecendo algumas pessoas em situação semelhante à sua.

Sim, a história não tem nada de inovadora e, pelo contrário, poderia muito bem ter caído no nível do banal. Porém, isso não acontece, devido à ótima performance de Alessandra Negrini como Violeta. A atriz incorpora a personagem e traz à tona de forma clara, mas também sutil, todas as emoções sentidas pela mulher abandonada, indo desde o sofrimento mais dolorido, como quando ela, em um quarto de motel, escuta novamente a mensagem deixada pelo marido, até a mais pura alegria e descontração, como quando ela dança ao som de "Maniac" do filme "Flashdance" em uma boate. Enfim, é uma bela atuação e um grande momento em sua carreira.

Porém, a direção de Karim Aïnouz também deixa o filme mais interessante. A fim de intensificar os sentimentos não só de Violeta, mas também de outras personagens, o diretor faz bastante uso da imagem e do som. Por exemplo, a primeira cena do filme mostra Djalma mergulhando na praia, enquanto ouvem-se os trovões de uma iminente tempestade, anunciando a tragédia que está para acontecer; no caso, o fim do casamento. Um outro momento de uso primoroso desse recurso ocorre na cena logo após a chegada de Violeta ao aeroporto. Nesse momento, a personagem está sozinha num saguão e acima de sua cabeça está o painel de pousos e decolagens. Até aí, tudo normal, porém o grande detalhe é que o último voo anunciado tem como destino Vitória, dando a entender que a personagem vai conseguir superar tudo aquilo. Acredito que isso pode até ter sido acidental, mas não é que se encaixou perfeitamente no contexto do filme?

O roteiro de Aïnouz e Beatriz Bracher também merece destaque. Apesar de ser, definitivamente, um drama, "O Abismo Prateado" possui, em diversos pontos da trama, elementos bastante singelos de humor. Não há como não abrir leves sorrisos quando uma taxista conta os seus desencontros amorosos à Violeta ou quando a moça conversa no banheiro com a menina Bel. Por sinal, a jovem Gabi Pereira como Bel e Thiago Martins como Nassir, o pai da menina, estão de parabéns por suas atuações.

"O Abismo Prateado" poderia ter sido uma verdadeira chatice, um filme com personagens pouco críveis e altas pretensões de seu realizador. Porém, felizmente, o oposto acontece. No geral, o filme é tão interessante que nem mesmo o seu ritmo lento chega a cansar (afinal, tem apenas 83 minutos de duração). Recomendo!

NOTA: 4/5


segunda-feira, 22 de abril de 2013

Oblivion (Oblivion)


Dir.: Joseph Kosinski; Escrito por Joseph Kosinski, Karl Gadjusek e Michael Arndt; Com Tom Cruise, Andrea Riseborough, Olga Kurylenko, Morgan Freeman. 2013 - Universal (126 min. - 12 anos)


Apesar de já estar chegando aos 51 anos de idade, Tom Cruise ainda é, mesmo que não na mesma proporção que há 15, 20 anos atrás, o maior astro de cinema da atualidade. Conhecido pelo mais alternativo dos cinéfilos como também pelo mais ordinário dos espectadores de fim de semana, Cruise tem sim seus muitos opositores, que, simplesmente, não entendem a sua fama. Ainda mais depois que a sua vida pessoal se tornou uma verdadeira Caras das bizarrices. Afinal, quem não se lembra dele pagando o maior mico de sua carreira no sofá da Oprah? Ou, então, de sua relação pra lá de duvidosa com a Cientologia? E por que não falar das histórias louquíssimas que envolveram a sua separação de Katie Holmes? Porém, se há algo que não se pode contestar sobre Tom Cruise é que ele sempre tenta diversificar os seus filmes. Desde dramas como "De Olhos Bem Fechados" - último filme de Stanley Kubrick -, "Magnólia" de Paul Thomas Anderson e "Vanilla Sky" de Cameron Crowe, passando por comédias como "Jerry Maguire - A Hora da Virada" e até por musicais como "Rock of Ages - O Filme", Cruise, sem dúvida, usa a sua fama mundial para chamar mais atenção para filmes que talvez não ganhassem tanta publicidade sem ele. O mesmo se aplica à ficção-científica, gênero no qual ele se tornou "habitué" e no qual ele sempre procura histórias diferentes, como as adaptações "Minority Report - A Nova Lei" (Phillip K. Dick) e "Guerra dos Mundos" (H. G. Wells) e o seu mais novo filme, "Oblivion".

Dirigido por Joseph Kosinski, "Oblivion" tem uma premissa bastante interessante. No ano de 2077, a Terra está devastada e, portanto, inabitável, resultado de uma guerra química com uma inteligente raça alienígena representada pelos Saqueadores. Apesar de terem sido vitoriosos, os terráqueos se veem obrigados a sair do planeta e procurar um novo lar; por isso, os humanos estão vivendo dentro de uma estação espacial chamada Tec, enquanto esperam para serem transferidos para Titã, uma das luas de Saturno. Entretanto, antes de seguir viagem, devem ser retiradas da Terra toda e qualquer riqueza natural ainda existente, principalmente a água dos oceanos, o que explica a existência de enormes plataformas que retiram este bem extremamente preciso. Para manter estes equipamentos e outros funcionando corretamente, especialmente os drones (espécie de robôs-vigilantes), estão sozinhos na Terra dois terráqueos, Jack e Victoria, que têm como única missão, respectivamente, consertar os robôs defeituosos e transmitir informações da Terra para a Tec. Porém, quando Jack encontra humanos dentro de câmaras de criogenia, incluindo uma mulher que ele vê constantemente nas lembranças que ainda lhe restam, ele começa a perceber que há muita coisa escondida por debaixo dos panos e que, por isso, a verdade talvez não seja tão verdadeira assim.

A primeira metade do filme, na qual as personagens são apresentadas e a história é estabelecida, é digna dos melhores filmes de ficção-científica da atualidade. Por um bom tempo eu achava estar diante de uma joia como "Looper - Assassinos do Futuro" ou "Contra o Tempo". Porém, o que começa com muita promessa acaba perdendo força com o passar do tempo.

O diretor Kosinski, sem sombra de dúvida, é um ótimo realizador no que diz respeito ao visual de seus filmes. Seu longa anterior, "Tron: o Legado", usufruía de uma exuberante fotografia e efeitos especiais de altíssima qualidade; isso sem contar com os figurinos high-tech e a direção de arte minimalista. Em "Oblivion", o mesmo acontece. A fotografia - cortesia do recém-oscarizado Claudio Miranda ("As Aventuras de Pi") - é espetacular e fica ainda mais bonita na tela maior e em alta definição do IMAX (fica a dica!). Os efeitos especiais aqui dão mais espaço a paisagens naturais do que em "Tron", mas ainda assim, estes são extremamente bem feitos. O figurino é impecável e a direção de arte de Darren Gilford segue a mesma linha clean do filme anterior de Kosinski, mas usa mais tons pastéis, em oposição ao branco e azul neon, onipresentes em "Tron". Além disso, as comparações não param por aí: se para "Tron", Kosinski convocou a dupla de DJs do Daft Punk para produzir a trilha sonora (incrível, por sinal), para "Oblivion", os encarregados são Anthony Gonzales (da banda eletrônica M83) e Joseph Trapanese, que colaborou com Daft Punk na composição da trilha de "Tron".

Porém, assim como o filme da Disney era um primor visual e uma decepção narrativa, "Oblivion" deixa a desejar no que diz respeito ao seu roteiro. A premissa, como já disse, é mesmo inventiva e merecia um filme melhor, porém o desenvolvimento desta, apesar de coerente, não consegue manter o impacto inicial que se tem com o filme. Ironicamente, exatamente quando as revelações começam a ser feitas, o filme perde força, se tornando um sci-fi convencional. Isso se deve a dois fatores: o número de reviravoltas e as personagens desinteressantes. 

Quanto ao primeiro, em sua segunda metade, o longa contém um número enorme de revelações, o que de início é empolgante, porém após a milésima o esquema começa a parecer um pouco exagerado. Além disso, certas descobertas, como a relação entre as personagens de Tom Cruise e Olga Kurylenko, são bem previsíveis. Já sobre o segundo, a falha é mais grave. Se o filme mantivesse o número enorme de reviravoltas, mas contasse com figuras mais envolventes, o longa talvez fosse melhor. O protagonista, Jack (Cruise), é um clichê ambulante desse tipo de filme - o homem que, como quem não quer nada, coleciona vários objetos antigos e que descobre até um paraíso escondido em pleno inferno - e não traz muita emoção à história. As personagens de Kurylenko e Morgan Freeman também não conseguem trazer muito gás ao filme porque a primeira é banal e a segunda aparece pouco, evitando que seja deixada uma marca mais forte. Na realidade, a personagem mais interessante do filme é Victoria, a companheira de trabalho e cônjuge de Jack, que parece ser a única na qual foi investida um pouco mais de tempo em sua construção psicológica. Não é por nada que enquanto o resto do elenco está normal, Andrea Riseborough consegue se sobressair na pele da moça que acredita piamente na verdade dita pelo povo da Tec e ter, de longe, a melhor performance do longa.

Enfim, "Oblivion" vale a pena ser visto no cinema por causa de sua produção caprichada. Quanto à narrativa, porém, alguns ajustes sutis já conseguiriam elevar o nível do material. Enquanto isso, Joseph Kosinski fica apenas na promessa como um ascendente diretor de ficção-científica, daqueles que têm as armas para fazer uma obra-prima do gênero, mas que ficam limitados pelo trabalho irregular dos outros. Pelo menos "Oblivion" já mostra uma melhora em relação a "Tron: o Legado", seu filme de estreia.

NOTA: 3/5


Chamada de Emergência (The Call)


Dir.: Brad Anderson; Escrito por Richard D'Ovidio; Com Halle Berry, Abigail Breslin, Michael Eklund, Morris Chestnut. 2013 - Diamond Filmes (94 min. - 16 anos)


Antes de "Chamada de Emergência", Halle Berry vinha numa sucessão de fracassos de bilheteria (e frequentemente de crítica também) como "A Viagem" (mesmo que este seja injusto), "A Estranha Perfeita", "Noite de Ano Novo" e "Maré Negra". Entretanto, quem diria que um típico thriller daria uma guinada na carreira da primeira intérprete negra a levar para casa o Oscar de melhor atriz?

O filme possui uma história bem simples. Jordan é uma operadora do 911 (linha de emergência dos EUA) que ficou traumatizada quando, por impulso, ocasionou a morte de uma jovem que ligou para o serviço porque um homem estava invadindo a sua casa. Seis meses mais tarde, ocupando agora um cargo que exija menos sangue frio, Jordan está melhor e praticamente recuperada do choque que sofreu. Porém, quando uma adolescente liga para o 911 dizendo que está presa dentro de um porta-malas após ter sido sequestrada por um sujeito, Jordan precisa tomar as rédeas da situação e impedir que mais uma jovem seja assassinada.

Dirigido por Brad Anderson, "Chamada de Emergência" tem a seu favor uma ótima atuação de Berry como a atormentada atendente Jordan. O que poderia ter sido uma interpretação descartável em seu currículo se tornou uma pequena e brilhante joia em sua carreira. Entretanto, vale lembrar que a adolescente do outro lado da linha é a também ótima Abigail Breslin - sim, a eterna menininha de "Pequena Miss Sunshine". Este filme é um daqueles casos em que a dupla principal consegue, através de uma química invejável, carregar praticamente todo o filme nas costas.

Porém, Anderson também merece créditos pelo sucesso do filme. A sua direção segura e eficiente, aliada à dinâmica edição de Avi Youabian e à claustrofóbica trilha sonora de John Debney, que usa e abusa de música eletrônica pulsante, fazem do filme um exemplo de como dirigir um thriller: emocionante, mas sem exageros.

A única ressalva séria que pode ser feita ao filme é o final pra lá de fantasioso. Uma verdadeira viagem na maionese, o último ato por pouco não quebra o realismo pelo qual o filme presa até então. Felizmente, as qualidades já citadas acima conseguem evitar o desastre e manter o longa com um resultado final positivo.

Apesar de não ser especialmente memorável nem ter pretensões maiores a não ser deixar a plateia com os nervos à flor da pele, "Chamada de Emergência" é um suspense acima da média e que, acredito eu, irá se tornar um grande sucesso na "Tela Quente" daqui uns dois ou três anos.

NOTA: 3.5/5


domingo, 21 de abril de 2013

A Busca


Dir.: Luciano Moura; Escrito por Luciano Moura e Elena Soarez; Com Wagner Moura, Mariana Lima, Lima Duarte. 2013 - Downtown Filmes (96 min. - 12 anos)


Dificilmente a gente vê um filme comercial brasileiro que fuja de um dos dois gêneros a seguir: a comédia e o drama biográfico. É só uma questão de ver os longas brasileiros de maior sucesso no ano passado para comprovar isso: "De Pernas pro Ar 2" (comédia), "Até que a Sorte nos Separe" (comédia), "Os Penetras" (comédia), "E aí... Comeu?" (comédia) e "Gonzaga - De Pai para Filho" (drama biográfico). Por isso que me deu vontade de ir assistir a "A Busca". Não é todo dia que um drama familiar (não baseado em acontecimentos reais) misturado com filme de ação chega às nossas telonas com tamanha divulgação.

O longa acompanha um casal, Theo e Branca, que em pleno processo de separação leva um baque quando o filho desaparece sem mais nem menos bem no dia de seu aniversário. Theo, então, desesperado, resolve ir à procura do filho pelos lugares mais inóspitos do interior do Brasil, ao mesmo tempo em que repensa a sua própria relação com seu pai.

Estreia de Luciano Moura na direção, "A Busca" já merece destaque por sua produção caprichada. Ao contrário de muitos filmes brasileiros que vemos por aí, o longa possui uma fotografia cuidadosa (apesar de abusar de closes muito próximos ao rostos dos atores) e uma direção de arte muito bem feita. A edição, essencial para que um filme desse tipo mantenha o ritmo, também é exemplar e de extrema precisão.

Porém, o filme ganha muito com a presença de Wagner Moura. O ator, que em outras ocasiões já mostrou todo o seu potencial, aqui continua a fazer um excelente trabalho. Em nenhum momento sua personagem cai na caricatura, cheia de caras e bocas, como poderia ter acontecido. Ao invés disso, Moura cria um Theo realista, mas sem deixar que ele se torne uma pessoa fria, que acabe se distanciando do espectador. Nada a reclamar também dos coadjuvantes Mariana Lima e Brás Antunes que cumprem bem o seu papel e da participação especial de Lima Duarte numa atuação sincera e de extrema importância emocional para a história.

Entretanto, o roteiro deixa um pouco a desejar. A busca em si parece mais uma brincadeira de ligar os pontos, idêntica àquelas de livro infantil, como também o drama da separação de Theo e Branca não sai do óbvio em nenhum momento. Além disso, há aqueles absurdos típicos de filmes do gênero como, por exemplo, por que, em nenhum momento, os pais pensam em ligar para a polícia? Como o carro de Theo consegue andar por tanto tempo sem ter de abastecer o tanque de gasolina? Enfim, não é nada que prejudique fatalmente o filme, mas também não há nenhuma novidade no enredo.

Lançado no Festival de Sundance de 2012, quando ainda se chamava "A Cadeira do Pai", "A Busca" merece parabéns por investir num gênero pouco explorado pelo cinema brasileiro, mesmo que não tenha um roteiro muito inspirado. Pelo menos vê-se um esforço da Globo Filmes (inegavelmente a maior produtora de filmes do Brasil) em investir em projetos fora da sua zona de conforto.

NOTA: 3.5/5


quinta-feira, 18 de abril de 2013

Sucker Punch - Mundo Surreal (Sucker Punch)


Dir.: Zack Snyder; Escrito por Zack Snyder e Steve Shibuya; Com Emily Browning, Abbie Cornish, Vanessa Hudgens, Carla Gugino. 2011 - Warner (110 min. - 14 anos)


A ideia por trás de "Sucker Punch - Mundo Surreal" é bastante interessante. Uma adolescente, cuja mãe acabou de morrer e que acidentalmente matou a própria irmã, é enviada por seu padrasto para um hospício onde são feitos procedimentos, no mínimo, inusitados, como a lobotomia. Porém, ao mesmo tempo, a jovem, enquanto dentro da instituição, é transformada em prostituta e dançarina e se une às outras garotas do local para planejar uma fuga desse pesadelo. Só que o grande mote do filme é que cada etapa do plano das meninas recebe ares fantásticos e é embalado por uma música diferente. Em outras palavras, o longa se propõe a misturar intimamente narrativa, música e visual para contar de forma inovadora uma história simples. É uma pena, portanto, que "Sucker Punch" seja tão sem graça.

Dirigido por Zack Snyder, realizador de "300" e "Watchmen - O Filme", o longa tem a seu favor o visual marcante, marca registrada de seu realizador. Assim como o filme dos espartanos, "Sucker Punch" foi filmado em grande parte usando a tela azul, dando ao filme a impressão de que o seu orçamento era o dobro do orçamento real. Além disso, a fotografia, especialmente nas cenas dentro do hospício, é muito bem realizada. Entretanto, tenho que admitir que os efeitos especiais deixam a desejar, ainda mais num filme que faz tanto uso deles.

A trilha sonora, que é parte fundamental para a história do filme, também é um dos pontos altos do longa. Com remixagens e covers de sucessos da música pop como "Army of Me" da cantora islandesa Björk e "Sweet Dreams (Are Made of This)" da dupla Eurythmics, a seleção musical do filme é, realmente, de altíssima qualidade.

Porém, no que diz respeito ao roteiro, o filme decepciona profundamente. Apesar de raros, há certos filmes que fariam bom uso de mais uns 15, 20 minutos de duração, e "Sucker Punch" é um deles. Com toda a história de fundo da protagonista reduzida a menos de cinco minutos, servindo de sequência de abertura do longa, as motivações da personagem, apesar de justas, nunca parecem muito convincentes. Tudo bem, sabemos que ela foi prostituída contra a sua vontade e que ela odeia o padrasto, mas em nenhum momento se sente isso; tudo fica muito preto no branco. Não há nuances, e isso se deve à construção precária da personagem. Na verdade, não só dela, mas de todas as outras também.

Além disso, não entendi a contradição absurda que permeia todo o filme. O tempo todo, a narrativa levanta a bandeira do feminismo, de como a mulher não deve se submeter aos homens, etc. etc. etc. Porém, nas sequências de batalhas, que representam as etapas da fuga, todas as garotas usam roupas minúsculas, que deixam coxas e decotes de fora. Não estou dizendo que elas deviam usar roupa de freira, mas se essas batalhas são exatamente o momento em que elas se libertam da dominação masculina, por que nessas sequências elas se vestem como verdadeiros fetiches masculinos ambulantes? Quer dizer que o filme, que prega o feminismo, para atrair o público masculino, precisa mostrar jovens mulheres de roupa de colegial? Na minha visão, isso é o filme, literalmente, jogando a sua mensagem por água abaixo só para poder arrecadar mais dinheiro nas bilheterias.

O elenco também é outra decepção. A protagonista Emily Browning não consegue sustentar o filme pelo simples fato de ela passar o filme inteiro com a mesma expressão facial. Até Carla Gugino, que é uma atriz bastante competente, não consegue fazer mais do que um sotaque nazista. Para falar a verdade, os únicos que conseguem se sobressair são Oscar Isaac, como o diretor do hospício, e Abbie Cornish, como uma das garotas fugitivas. Somente os dois conseguem dar aos seus personagens algo a mais.

"Sucker Punch - Mundo Surreal" é uma bela ducha de água fria em quem esperava um filme emocionante e coerente. Para quem se decepcionou, pelo menos há um consolo: Zack Snyder não colocou nenhuma sofrível cena de sexo no filme.

NOTA: 2/5


quarta-feira, 17 de abril de 2013

Piratas Pirados! (The Pirates! In An Adventure with Scientists!)


Dir.: Peter Lord e Jeff Newitt (co-direção); Escrito por Gideon Defoe; Com Hugh Grant, Martin Freeman, Imelda Staunton, David Tennant. 2012 - Sony (88 min. - Livre)


A Aardman Animations é a produtora de alguns dos melhores filmes de animação da última década como "A Fuga das Galinhas", "Wallace e Gromit - A Batalha dos Vegetais" e "Por Água Abaixo". Os filmes do estúdio são daqueles que conseguem agradar perfeitamente tanto crianças quanto adultos, pois para os primeiros há muita ação e personagens divertidos, já para os últimos há um humor tipicamente britânico de altíssima qualidade. E "Piratas Pirados!" faz jus ao seu criador.

O filme, baseado no primeiro livro de uma série de cinco, acompanha as peripécias do Capitão Pirata e a sua tripulação enquanto eles procuram uma forma de conseguir imensa riqueza em pouquíssimo tempo. Para quê? Para fazer com que o Capitão consiga vencer o prêmio de Pirata do Ano, troféu para o qual ele se inscreveu inúmeras vezes e nunca ganhou; tanto que virou motivo de chacota para toda a comunidade dos piratas.

Um dos aspectos mais interessantes de "Piratas Pirados!" - cujo nome original resume muito bem a ideia do filme - são as suas referências a figuras verídicas, como por exemplo Charles Darwin. No longa, o naturalista inglês é uma das personagens mais importantes, pois é ele, que ao ter sua embarcação atacada pelos piratas enquanto rodava o mundo fazendo pesquisas para a sua grande obra, "A Origem das Espécies", descobre que o papagaio do Capitão Pirata é, na verdade, uma espécie de ave que todos acreditavam estar extinta. Porém, não é apenas Darwin que dá o ar da graça no filme. A grande vilã da história é ninguém menos que a mais famosa monarca britânica, a Rainha Vitória, que no filme é mostrada como uma mulher louca e que odeia piratas mais do que qualquer outra coisa. Já em breves participações há também a escritora Jane Austen, representada como uma mulher boêmia, e o Homem Elefante, que era sacaneado por todo mundo. Enfim, não tenho palavras para dizer o quanto eu gostei de ver um filme, supostamente, voltado para o público infantil ter tantas referências históricas e culturais.

Porém, o roteiro primoroso não se deve apenas a isso. A própria história, recheada de humor satírico, e os ótimos personagens já valem o valor do ingresso ou da locação. O Capitão Pirata, um típico comandante pomposo e metido a besta, é apenas a cereja em cima do bolo, que conta ainda com os integrantes da inusitada tripulação do navio, entre eles o meu favorito: o Pirata Surpreendentemente Curvilíneo. Quem me entendeu...

Mas não só a narrativa, como toda a produção é extremamente bem-feita. A animação em stop-motion é incrível, mas o que mais impressiona nesse tipo de filme são os detalhes dos figurinos e dos cenários, que no frigir dos ovos, são feitos para, respectivamente, vestir e abrigar bonecos feitos a partir de massa de modelar. Quando você para para pensar na miudeza de cada um daqueles objetos espalhados na cabine do Capitão, por exemplo, é quando você percebe quanto trabalho que um filme desse exige para ser feito.

Em poucas palavras, "Piratas Pirados!" é uma ótima animação, que não faz o espectador - tanto adulto quanto infantil - de idiota e que ao mesmo tempo diverte horrores. Por isso, é uma pena que o filme tenha ido mal de bilheteria, o que certamente me vai impedir de ver as outras aventuras dos piratas que envolvem Moby-Dick, comunistas, românticos e até Napoleão.

NOTA: 4/5


terça-feira, 16 de abril de 2013

O Profissional (Léon)


Dir.: Luc Besson; Escrito por Luc Besson; Com Jean Reno, Gary Oldman, Natalie Portman. 1994 - Sony (110 min. - 14 anos)


Léon é um experiente assassino de aluguel, contratado apenas para as missões mais difíceis de serem realizadas. Para chegar a esse nível, ele nunca se deixou levar pelas emoções. Porém, quando a família que mora no apartamento ao lado do seu é brutalmente assassinada por um policial corrupto e seus capangas, sobrando apenas a filha do meio, Mathilda, que, por sorte, tinha ido ao mercado na hora do massacre, Léon se mostra solidário à menina e decide ajudá-la a vingar a morte de seu irmãozinho, o único membro de sua família pela qual ela tinha qualquer tipo de afeto.

Quinto filme do diretor Luc Besson, "O Profissional" é um ótimo filme de ação dos meados da década de 1990. Protagonizado por Jean Reno, numa performance inspirada, o longa se beneficia enormemente de seu ótimo roteiro, escrito pelo próprio Besson. Misturando sequências de ação de tirar o fôlego com momentos de humor satírico (algo que ele levaria ao extremo em seu filme seguinte, "O Quinto Elemento"), mas também demonstrando um tato para a doçura e para o sentimentalismo em meio à desgraça, "O Profissional" têm elementos para agradar a gregos e troianos.

O elenco também contribui bastante para a agradabilidade do filme. Além de Reno, a presença de Natalie Portman - à época ainda na adolescência - como a jovem Mathilda, já mostrando todo o seu potencial como atriz, também traz muita simpatia para o filme, ajudando a balancear o tema violento com o relacionamento afetuoso entre a sua personagem e o protagonista. Como o policial Stansfield, o grande vilão do filme, Gary Oldman está excelente, fazendo de sua personagem um misto de bandido e comediante. Não é por nada que muitos dos melhores momentos do filme estão por conta dele.

Como se tudo isso já não fosse o bastante, a direção super eficiente de Besson traz muito dinamismo ao filme, fazendo com que não sintamos em nenhum momento as quase duas horas de duração do longa. Merece parabéns também o compositor Eric Serra, que com suas criações musicais consegue beneficiar ainda mais o ritmo acelerado do filme.

Uma combinação de filme de ação, drama e comédia, "O Profissional" é uma ótima pedida tanto para os cinéfilos quanto para o espectador comum. Em ambos os casos, a diversão é garantida!

NOTA: 4/5


Destinos Ligados (Mother and Child)


Dir.: Rodrigo García; Escrito por Rodrigo García; Com Naomi Watts, Samuel L. Jackson, Annette Bening, Kerry Washington. 2009 - PlayArte (125 min. - 14 anos)


Olhe para o pôster acima e me diga que tipo de filme você pensa que "Destinos Ligados" é. Certamente, você deve ter dito que se trata de uma comédia romântica sem sal ou de um drama água-com-açúcar. Nesse sentido, não vou discordar de você. Ao ver Naomi Watts e Samuel L. Jackson de cabecinha junta e sorrindo um para ou outro já até senti minhas taxas de glicose indo lá pro espaço. Porém, acredite se quiser, "Destinos Ligados" está longe de ser isso o que você está pensando; ao contrário, é um drama bastante realista, sem papas na língua, longe de ser uma fantasia amorosa hollywoodiana.

O filme acompanha simultaneamente a história de três mulheres. A primeira delas, Karen, é uma amargurada fisioterapeuta de meia-idade que vive com a mãe doente e que não se conforma de ter dado a sua única filha para a adoção. Mas por que, então, ela fez isso? Simples, ela foi mãe ao quatorze anos de idade. Entretanto, ela nem imagina que na mesma cidade, vive a filha que ela não conhece; e é ela a protagonista da segunda história.

Elizabeth é uma advogada de trinta e tantos anos que acabou de chegar na cidade, após ter se mudado pela enésima vez. Ao contrário do que se espera, ela é, na verdade, uma profissional competentíssima. O motivo de suas inúmeras mudanças são os seus relacionamentos frustrados; porém, nada muda e ela mal é contratada e já começa a ter um caso com o chefe. Além disso, ela também transa com o seu vizinho, que acabou de se tornar pai. Como já é de se esperar, a situação se complica quando ela fica grávida, sem saber quem é o pai da criança.

Paralelamente às duas primeiras histórias, desenrola-se uma terceira, protagonizada por Lucy, uma confeiteira que, por não conseguir ter filhos, decide adotar uma criança. Para isso, ela irá ao mesmo orfanato onde Karen deixou sua filha há quase quarenta anos atrás.

Escrito e dirigido por Rodrigo García - filho do escritor colombiano Gabriel García Márquez -, "Destinos Ligados" tem entre as suas maiores qualidades o roteiro honesto de García. Fugindo de uma construção superficial das personagens (se quisesse, poderia ter transformado Karen e Elizabeth em verdadeiras víboras) e de soluções fáceis, o diretor/roteirista cria uma história humana e de fácil identificação, principalmente para o seu público-alvo: mulheres que são ou que querem ser mães. Além disso, García tem um dom para construir diálogos inteligentes, mas ao mesmo tempo, acessíveis para espectadores de todos os tipos. Dessa forma, o filme evita o didatismo vazio e a banalização de seus temas difíceis.

Mas se García já é um ótimo roteirista, ele também é um experiente diretor de atores. O trio de protagonistas, formado pelas já ótimas Annette Bening, Naomi Watts e Kerry Washington, está excelente e mostra-se em total sintonia com as suas complexas personagens. Elas mostram emoção sem cair no melodrama escandaloso.

Entretanto, tecnicamente falando, García ainda precisa de mais treino. Apesar de já ter melhorado nesse aspecto em seu último filme, o igualmente emocionante "Albert Nobbs", "Destinos Ligados" muitas vezes parece um telefilme de baixo orçamento. Não é nada que prejudique fatalmente o filme, mas também não deixa de causar um constante incômodo.

Bem construído e narrado, "Destinos Ligados" é um interessante estudo sobre a maternidade e os assuntos que a circundam, como a adoção, o aborto e, principalmente, o amor.

NOTA: 3.5/5


segunda-feira, 15 de abril de 2013

O Quinto Elemento (The Fifth Element)


Dir.: Luc Besson; Escrito por Luc Besson e Robert Mark Kamen; Com Bruce Willis, Milla Jovovich, Gary Oldman, Chris Tucker. 1997 - Sony (126 min. - 14 anos)


Apesar de já terem se passado mais de quinze anos desde a estreia de "O Quinto Elemento", até hoje, o longa do diretor francês Luc Besson é um dos mais controversos títulos do gênero da ficção-científica. Há um grupo que o considera uma das maiores palhaçadas em todos os sentidos já lançada: história, atuação, cenografia, figurino etc: tudo uma porcaria! Porém, como todo filme polêmico, "O Quinto Elemento" tem também seus defensores, que veem nele um dos mais divertidos sci-fi dos últimos vinte anos. Bom, digo com muito orgulho que eu me encaixo no segundo grupo.

Não posso mentir e dizer para você que o filme prima pelo bom-gosto. Muito pelo contrário, tudo é exagerado e demasiadamente kitsch, até para aqueles que consideram o kitsch algo cool. Porém, é exatamente aí que está o charme de "O Quinto Elemento". O filme não seria o mesmo se não fossem os alienígenas toscos, o cabelo laranja da Milla Jovovich e o penteado medonho do Gary Oldman. E sabe por que tudo isso dá certo? Porque em nenhum momento o filme se leva a sério.

Tudo começa com a história. Em pleno século XXIII, uma força extraterrestre em constante crescimento ameaça a vida na Terra, o que traz preocupações às grandes autoridades do planeta, que não conseguem encontrar uma solução para evitar a catástrofe. É aí que chegam à Terra naves lideradas por uma raça alienígena que tem a resposta para todo o Mal do Universo: o Quinto Elemento. Entretanto, quando esses seres são atacados, o Quinto Elemento desaparece, até que é, felizmente, encontrado por cientistas ligados ao governo. Porém, nem tudo é tão fácil quanto parece, pois ao darem à nova descoberta uma forma humana, chamada Leeloo, esta foge do laboratório onde estava presa e sai em busca, em plena Nova York do futuro, de um padre que irá lhe ajudar a atingir os seus objetivos de salvar o planeta. Porém, em suas andanças ela encontra um ex-major, agora taxista, que irá ajudá-la e se vê frente a frente com uma mente perigosa que deseja capturá-la e deixar que o Mal corra solto pela Terra.

Se você já achou o enredo bobo, isso é porque você ainda nem ficou sabendo do resto do longa. Para fazer companhia a esta história digna de filmes-B, o diretor Luc Besson decidiu fazer um filme totalmente acima do tom e com personagens dignos de filmes de ficção-científica da pior categoria. Para isso, o elenco não faz por menos e entra de cabeça na brincadeira. Bruce Willis, como o ex-major Korben Dallas, faz o seu melhor tipo de herói de ação, cheio de humor e simpatia. Milla Jovovich está encantadora como Leeloo, ainda mais quando ela fala na língua extraterrestre. Chris Tucker está um desbunde como o mais famoso apresentador do planeta, Ruby Rhod, uma espécie de Prince ainda mais afetado e adaptado para o futuro. Mas o melhor de todos é mesmo Gary Oldman como o grande vilão Zorg. O ator aproveita a chance e faz uma performance memorável, extremamente exagerada, mas sem cair no ridículo.

Quanto à produção, quanto mais espalhafatoso melhor! Os figurinos, desenhados pelo renomado estilista Jean-Paul Gautier, são todos bastante coloridos e dignos de um desfile de escola de samba de daqui 200 anos. A direção de arte não podia ser diferente e também é bem grandiosa e cafona. Enfim, tudo é feito para lembrar aqueles sci-fi de visual psicodélico e vibrante.

Ame ou odeie, uma coisa é certa: "O Quinto Elemento" é um daqueles filmes que vai ficar para a história do cinema como algo único; uma experiência completamente diferente de tudo que já foi feito antes e que dificilmente será repetida. Para mim, um grande admirador do longa, ele vai ser um daqueles filmes que de tempos em tempos eu vou rever e me divertir adoidado. Não é por nada que até hoje é um símbolo do cinema dos anos 1990.

NOTA: 4/5


Correndo com Tesouras (Running with Scissors)


Dir.: Ryan Murphy; Escrito por Ryan Murphy; Com Joseph Cross, Annette Bening, Brian Cox, Evan Rachel Wood. 2006 - Sony (122 min. - 14 anos)


Diz-se que todo mundo tem um pouco de loucura dentro de si, seja um temperamento explosivo, crenças de caráter duvidoso e até inofensivas superstições entram nessa categoria. Porém, há sempre aqueles que não conseguem controlar a sua própria loucura e têm que ser isolados do resto da sociedade. O primeiro filme dirigido pelo cultuado produtor de tevê Ryan Murphy, "Correndo com Tesouras", anda na linha tênue que divide esses dois lados da insanidade; e o resultado, assim como os loucos, tem suas duas facetas.

Em poucas palavras, o filme conta a história real de Augusten Borroughs, filho de uma família abastada e à beira do colapso: seu pai não vive sem um copo de uísque na mão, enquanto a sua mãe, uma frustrada aspirante à poetisa, aos poucos começa a ficar louca. Por causa da crise no casamento, a mãe de Augusten procura um renomado psiquiatra a fim de resolver os seus problemas familiares, porém a situação é pior do que se imaginava e a única solução é afastar Augusten de sua mãe para que ele não seja influenciado por suas crises. Para facilitar a situação, o psiquiatra da família se oferece para abrigar o jovem Augusten em sua casa enquanto tudo se ajeita. Entretanto, ao contrário do que se espera, a família do médico é ainda mais maluca!

Como já é de se esperar de um trabalho de Ryan Murphy, "Correndo com Tesouras" começa bastante interessante, dando a entender de que será uma ácida comédia de humor negro. Afinal, se tem algo que o conhecido produtor sabe fazer muito bem é surgir com premissas pra lá de inusitadas, como aquelas de suas séries mais famosas: "Nip/Tuck" - que acompanha as vidas de dois famosos cirurgiões plásticos - e "Glee" - que reintegrou o gênero musical à televisão. Porém, o filme, assim como ambas as séries citadas, começa a dar sinais de que não vai conseguir cumprir a sua promessa. Para ser mais claro, o filme começa a desandar justamente quando o protagonista vai viver junto com a família do psiquiatra. A partir desse momento, o filme envereda para o drama e não sai mais dele, exceto em alguns momentos. Porém se fosse só isso, não haveria problema algum, entretanto, o drama nunca parece muito crível, o que acaba tornando o filme distante, falhando na missão de passar qualquer emoção ao público. Grande parte disso deve-se aos personagens em si, que são loucos em demasia, evitando uma maior conexão entre espectador e história. Só a título de comparação, a família Finch parece uma versão dramática da família Addams, o que venhamos e convenhamos, não é tão interessante e parece ainda mais fora da realidade.

Felizmente, a seu favor, o filme também tem fortes qualidades, sendo a principal delas o elenco. O protagonista, Joseph Cross, está muito bem como Augusten, o garoto que aos poucos se descobre numa nova realidade. Falando nessa nova realidade, a família Finch também conta com ótimas atuações de Evan Rachel Wood, Joseph Fiennes, Brian Cox, Jill Clayburgh e Gwyneth Paltrow. Entretanto, quem rouba mesmo a cena é a incomparável Annette Bening, que está excelente como Deidre Borroughs, mãe de Augusten.

Ainda no lado bom da loucura, está também a direção segura de Ryan Murphy, que consegue compensar, em parte, os problemas do roteiro - também de sua autoria.

No geral, "Correndo com Tesouras" é um filme decente e muito bem-feito, mesmo que não consiga atingir todo o seu potencial e fazer jus ao ótimo elenco que tem em mãos.

NOTA: 3/5


sábado, 13 de abril de 2013

O Novo Mundo (The New World)


Dir.: Terrence Malick; Escrito por Terrence Malick; Com Q'orianka Kilcher, Colin Farrell, Christopher Plummer, Christian Bale. 2005 - PlayArte (135 min. - 12 anos)


Em 1607, os ingleses chegaram à região do estado da Virgínia, nos EUA, montando uma pequena colônia à beira do mar. Porém, no entorno viviam os integrantes da tribo indígena Powhatan, liderada por Wahunsunacock, cuja filha se chamava Pocahontas. Durante uma expedição rio abaixo, um dos líderes dos colonos, John Smith, é sequestrado pelos indígenas e ameaçado de morte. Afinal, quem eram aqueles seres que estavam invadindo o território dos nativos da região? Entretanto, Pocahontas intervém e impede que Smith seja morto; em troca, ela ensina a cultura dos indígenas para ele, e ele a cultura dos ingleses para ela. Começa assim, um dos primeiros momentos de choque cultural na América do Norte. E é esse encontro que é relatado no filme "O Novo Mundo".

Dirigido por Terrence Malick (realizador do ótimo "Além da Linha Vermelha", mas do fraco "A Árvore da Vida"), o longa aborda a história da índia mais famosa do mundo como uma mistura de fantasia e realidade. Digo isso, pois, apesar de ser uma versão bem mais realista do conto da Pocahontas (afinal de contas, a versão mais conhecida da história é aquela apresentada no filme da Disney), o filme também não deixa de dar floreios românticos ao relacionamento entre a índia e John Smith. Na realidade, o romance entre eles até hoje não foi comprovado.

Como já é de se esperar de um filme de Malick, o longa conta com uma belíssima produção. A reconstituição de época é primorosa. Os navios ingleses, a colônia à beira mar, as construções na aldeia da tribo Powhatan, os figurinos: tudo é feito com extrema minúcia. Isso sem contar o fato de que o filme foi filmado em locais bastante próximos àqueles onde a história efetivamente se desenrolou. A trilha sonora, composta por James Horner, mas que também contém trechos de música clássica como o "Concerto para Piano número 23" de Mozart, é emocionante e bastante grandiosa, o que combina com os amplos espaços naturais que servem de cenário para a narrativa. Porém, o mais impactante é a belíssima fotografia de Emmanuel Lubezki, que captura com primor as imagens naturais, marca registrada da filmografia de Malick. Não é por nada que o diretor convocou Lubezki novamente para seu filme seguinte, "A Árvore da Vida", que apesar de suas falhas contém uma fotografia espetacular.

O elenco também é impressionante. Colin Farrell, como John Smith, está muito bem, assim como Christian Bale (que só aparece a partir da metade do filme), como John Rolfe, o homem que, no final das contas, se torna marido de Pocahontas. Ainda entre os ingleses, há as pequenas, mas mais do que especiais participações de Christopher Plummer e de David Thewlis. Entretanto, a grande estrela é Q'orianka Kilcher. Revelada nesse filme, Kilcher incorpora de forma exemplar a personagem de Pocahontas, a índia ingênua e curiosa, que se vê como peça-chave do conflito entre os nativos e os colonizadores. Realmente, foi uma bela descoberta de Malick.

Porém, apesar de, no geral, ser um bom filme, "O Novo Mundo" sofre muito com o ritmo. Com cerca de duas horas e quinze minutos de duração, o filme é um daqueles casos em que mais uma sessão de cortes seria o ideal. Por se tratar de um filme de Terrence Malick, eu já não esperava um filme muito movimentado, porém "O Novo Mundo" se torna um filme lento até demais, principalmente em sua segunda metade, o que torna a experiência, em certos momentos, enfadonha.

Apesar de seus probleminhas aqui e acolá, "O Novo Mundo" conta com uma história bastante interessante e um elenco de respeito, o que já faz dele uma recomendação.

NOTA: 3/5